domingo, 16 de fevereiro de 2014

ESCOLHA INFELIZ

 

Na definição genérica dada pelo antropólogo britânico Edward Burnett Tylor, cultura é “todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade”.
            Tantas são as manifestações culturais, que as comunidades mais evoluídas preferem concentrá-las num domicílio próprio. Um local onde possam ser exibidas, apreciadas, debatidas e criticadas no seu conjunto e em toda a sua extensão. São os centros culturais,  espaços arquitetônicos onde elas  se apresentam nas suas mais diferentes modalidades.
            Em termos de cultura, Valadares não pode reclamar de seu acervo. Possui grandes escritores, excelentes artistas plásticos, músicos virtuosos, atletas de renome, competentes profissionais liberais, e muitos outros talentos. Além disso, conta com ótima infraestrutura educacional, complementada por bons meios de comunicação e ampla rede de entidades e estabelecimentos difusores das artes.
            A cidade acaba de ganhar o Centro Cultural Nelson Mandela, inaugurado no último dia 05, no local em que por muitos anos existiu a cadeia pública. Convenientemente remodelado, transformou-se no espaço moderno e confortável onde já funcionam a Academia Valadarense de Letras (AVL) e a Biblioteca Pública Municipal Professor Paulo Zappi.
            O Centro inclui uma galeria de artes e um telecentro, tudo da melhor qualidade, representando a realização de antigo desejo comunitário.
            Apesar das obsequiosas explicações dadas pela Prefeita Elisa Costa, o nome Nelson Mandela não deu “Ibope”. Foi como chamar de Maradona o estádio corinthiano em que será aberta a próxima Copa do Mundo.
            Nada contra homenagear o grande líder sul-africano, mundialmente aplaudido e reverenciado em razão de indiscutíveis méritos. Chato foi isso acontecer em detrimento de personagens locais comprometidos e identificados com o que ali se pretende mostrar. Sem falar que Mandela, por maior que fossem seus conhecimentos geográficos, talvez não soubesse o ponto do planeta em que fica Valadares.
            No discurso de inauguração, a própria Chefe do Executivo lembrou alguém mais merecedor da homenagem, ao revelar que a realização da obra era um sonho do falecido ex-prefeito João Domingos Fassarella, a quem o valadarense dedica enorme afeição.
            Mas não faltariam outras ilustres opções, como os Irmãos Sales (Wenceslau e Ladislau), fundadores do tradicional Colégio Ibituruna; Talmir Canuto Costa, primeiro administrador do MIT, embrião da Univale; Aurita Machado, notável intelectual e incansável desbravadora; Celso Werneck, mestre em pirogravura, com obras espalhadas por todo o mundo;  padre João Werbeck, responsável por vários empreendimentos sócioculturais implantados na cidade; Parajara dos Santos, gênio do jornalismo local; o imortal Hermírio Gomes, cujo DNA está em quase todas as iniciativas progressistas de sua época;  afora muito mais gente.
            Outra alternativa teria sito batizar o local com o nome de alguns dos símbolos e marcos históricos da cidade: Ibituruna, Rio Doce, Princesa do Vale ou Figueira.
            Na verdade, faltou uma consulta popular, uma troca de ideias mais ampla, algo que tornasse a escolha mais democrática. Talvez poupando  Mandela, para não o expor ao  risco de constrangedora lanterna. 
 
- Jornal de Domingo