domingo, 31 de maio de 2015

A DOLOROSA É DO POVO

            No final de abril deste ano, a presidente Dilma Rousseff sancionou o Orçamento de 2015, sem vetar a emenda que aumentava de R$ 289 milhões para R$ 867,5 milhões o valor do Fundo Partidário.
Na ocasião, já se articulava a adoção de um arrocho fiscal que incluía profundos cortes nas verbas reservadas à Saúde, à Educação e a outros importantes setores do governo, a pretexto de reequilibrar as contas públicas.
A deliberação de Dilma soou tão desconexa, que foi criticada até pelo  senador Renan Calheiros, presidente do Senado e seu suposto aliado. Mesmo alertado de que parte dessa verba poderia vir a ser contingenciada, em face do ajuste econômico, Calheiros não se conformou. “A presidente fez o que havia de pior. Ela sancionou um aumento incompatível com o ajuste e disse desde logo que vai contingenciar. Ou seja, ela fez as duas coisas ao mesmo tempo e errou exatamente dos dois lados”, disse ele, acrescentando que “essas trapalhadas prejudicam muito o Brasil”.
Errada ou equivocada, a bola fora aconteceu. Pensou-se que ela marcaria o fim das constantes mancadas com que o Planalto tem testado a paciência do povo. Ledo engano!
Na contramão do regime de contenção de gastos apregoado pelo governo, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, no último dia 20, projeto de lei que concede aos servidores do Judiciário reajuste salarial que varia de 53% a 78,56%. Se aprovado, esse aumento será escalonado, de julho de 2015 a dezembro de 2017, e pago em seis parcelas. Em nota que precedeu a decisão da CCJ, o Ministério do Planejamento informou que o governo é contrário ao reajuste, porque seu impacto total nos próximos quatro anos será de R$ 25,7 bilhões. Isso, entretanto, não sensibilizou os membros daquela Comissão.
Como se esses dois exemplos não bastassem, uma nova decisão legislativa veio demonstrar que, em termos de economizar recursos públicos, há enorme descompasso entre o discurso e a prática.
Na quinta-feira passada (28), no bojo de Medida Provisória que eleva as alíquotas incidentes sobre importações, o Senado, mesmo a contragosto, mas para evitar prescrição da MP,  acabou confirmando um texto no qual a Câmara adicionou vários temas que nada têm a ver com a proposta elaborada pelo governo, os chamados “jabutis”. Entre esses, a autorização para que o Congresso faça parcerias público-privadas, abrindo caminho para a construção de um Shopping do Parlamento, já apelidado de “Parla Shopping”. A ideia, atribuída ao presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, seria construir um anexo com gabinetes mais luxuosos para os deputados, além de lojas comerciais que poderiam ser exploradas pela iniciativa privada. O custo da obra é estimado em R$ 1 bilhão. Se o projeto vai ou não “emplacar” é outra conversa.
Enquanto a atenção popular é desviada para esse festival de sandices, o caminho se abriu para as medidas que o governo aponta como indispensáveis para o ajuste econômico. Num cenário de falsidades e desfaçatez, em que até alguns oposicionistas costumam se render ao famoso troca-troca, a redução de direitos trabalhistas, a elevação de impostos e outras maldades têm tramitado sem maior dificuldade. Não se fala, porém, em reduzir o número de ministérios, dispensar pelo menos boa parte dos apadrinhados que mamam nas tetas do governo, reduzir gastos com cartões corporativos, cobrar de devedores inadimplentes ou outras iniciativas que signifiquem cortar na própria carne.
Os sinais são de que a conta pelos erros econômicos cometidos nos últimos doze anos deverá mesmo ser paga pelos trabalhadores, aposentados e remanescentes de uma classe média em fase de extinção.

A esses resta a humildade de reconhecer que quem vota mal paga duas vezes. E paga caro!

- Diário do Rio Doce