No final de abril deste ano, a
presidente Dilma Rousseff sancionou o Orçamento de 2015, sem vetar a emenda que
aumentava de R$ 289 milhões para R$ 867,5 milhões o valor do Fundo Partidário.
Na ocasião, já se articulava a adoção de um arrocho fiscal que incluía
profundos cortes nas verbas reservadas à Saúde, à Educação e a outros
importantes setores do governo, a pretexto de reequilibrar as contas públicas.
A deliberação de Dilma soou tão desconexa, que foi criticada até pelo senador Renan Calheiros, presidente do Senado
e seu suposto aliado. Mesmo alertado de que parte dessa verba poderia vir a ser
contingenciada, em face do ajuste econômico, Calheiros não se conformou. “A
presidente fez o que havia de pior. Ela sancionou um aumento incompatível com o
ajuste e disse desde logo que vai contingenciar. Ou seja, ela fez as duas
coisas ao mesmo tempo e errou exatamente dos dois lados”, disse ele,
acrescentando que “essas trapalhadas prejudicam muito o Brasil”.
Errada ou equivocada, a bola fora aconteceu. Pensou-se que ela marcaria o
fim das constantes mancadas com que o Planalto tem testado a paciência do povo.
Ledo engano!
Na contramão do regime de contenção de gastos apregoado pelo governo, a Comissão
de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, no último dia 20, projeto de
lei que concede aos servidores do Judiciário reajuste salarial que varia de 53% a
78,56%. Se aprovado, esse aumento será escalonado, de julho de 2015 a dezembro
de 2017, e pago em seis parcelas. Em nota que precedeu a decisão da CCJ, o
Ministério do Planejamento informou que o governo é contrário ao reajuste,
porque seu impacto total nos próximos quatro anos será de R$ 25,7 bilhões.
Isso, entretanto, não sensibilizou os membros daquela Comissão.
Como se esses dois
exemplos não bastassem, uma nova decisão legislativa veio demonstrar que, em
termos de economizar recursos públicos, há enorme descompasso entre o discurso
e a prática.
Na quinta-feira
passada (28), no bojo de Medida Provisória que eleva as alíquotas incidentes
sobre importações, o Senado, mesmo a contragosto, mas para evitar prescrição da
MP, acabou confirmando um texto no qual
a Câmara adicionou vários temas que nada têm a ver com a proposta elaborada
pelo governo, os chamados “jabutis”. Entre esses, a autorização para que o Congresso
faça parcerias público-privadas, abrindo caminho para a construção de um
Shopping do Parlamento, já apelidado de “Parla Shopping”. A ideia, atribuída ao
presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, seria construir um anexo com
gabinetes mais luxuosos para os deputados, além de lojas comerciais que
poderiam ser exploradas pela iniciativa privada. O custo da obra é estimado em
R$ 1 bilhão. Se o projeto vai ou não “emplacar” é outra conversa.
Enquanto a atenção
popular é desviada para esse festival de sandices, o caminho se abriu para as medidas
que o governo aponta como indispensáveis para o ajuste econômico. Num cenário
de falsidades e desfaçatez, em que até alguns oposicionistas costumam se render
ao famoso troca-troca, a redução de direitos trabalhistas, a elevação de
impostos e outras maldades têm tramitado sem maior dificuldade. Não se fala,
porém, em reduzir o número de ministérios, dispensar pelo menos boa parte dos
apadrinhados que mamam nas tetas do governo, reduzir gastos com cartões
corporativos, cobrar de devedores inadimplentes ou outras iniciativas que
signifiquem cortar na própria carne.
Os sinais são de que a
conta pelos erros econômicos cometidos nos últimos doze anos deverá mesmo ser
paga pelos trabalhadores, aposentados e remanescentes de uma classe média em
fase de extinção.
A esses resta a
humildade de reconhecer que quem vota mal paga duas vezes. E paga caro!
- Diário do Rio Doce