Por Etelmar Loureiro
- Diário do Rio Doce – 14.03.2019
No Brasil, várias são as leis que só foram aprovadas após intensa luta e
muito bate-boca.
Alguns exemplos são a da Ficha Limpa, a da Anistia, a Lei Seca, o Estatuto do
Desarmamento e a Lei Maria da Penha. A mais polêmica teria sido a Lei do
Divórcio, que enfrentou enérgica resistência religiosa. No geral, entretanto,
mesmo polarizando opiniões, quase todas acabaram bem aceitas e vigoram na sua
plenitude.
A
questão é que, com a evolução dos hábitos e costumes, certas normas se tornam
obsoletas ou incompatíveis com a realidade social, provocando pressões no
sentido de serem modificadas. É o caso do artigo 228 da Constituição Federal,
segundo o qual “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos,
sujeitos às normas da legislação especial”.
Há muito, tramita
no Congresso Nacional, já aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ) da Câmara dos Deputados, uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC 171,
de autoria do ex-deputado brasiliense Benedito Domingos), formulada em 1993, que
reduz essa idade para 16 anos.
Como
se não bastassem mais de duas décadas de gaveta, o imbróglio continua longe de
ser desfeito. Ainda lhe resta um longo e desafiante caminho a percorrer, até
que a proposta chegue à apreciação do Senado, onde receberá a palavra
final. A esperança é de que agora, alinhada com o pensamento do presidente
Jair Bolsonaro, a ideia prospere com agilidade.
O “resumo da ópera”
mostra que tudo gira em torno do tratamento a ser dado a uma categoria de
bandidos que agem com a brutalidade de adultos, mas são punidos com a
benevolência do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), reservado aos
menores de até 18 anos. Se mudanças acontecerem, grande parte desses
brutamontes perderia a moleza.
Contudo, além de arguir a constitucionalidade da PEC, seus opositores acham
absurdo que jovens entre 16 e 18 anos se exponham às deficiências e mazelas do
sistema prisional brasileiro, que os levaria a progredir na criminalidade.
Argumentam que o ECA contempla medidas socioeducativas que, se bem aplicadas,
seriam suficientes para orientar os adolescentes e impedir sua reincidência no
crime.
Na outra extremidade, uma significativa maioria defende que o indivíduo lesivo
à sociedade, adulto ou adolescente, deve ser isolado, para não incorrer em mais
delitos. Diante dos crimes praticados pelos “dimenores”, cada vez mais
frequentes e brutais, a redução da maioridade penal é vista por esse grupo como
eficiente e inadiável avanço na batalha por mais segurança e menos impunidade.
Trata-se, pois, de matéria controversa, que requer imparcial reflexão sobre
os diferentes pontos de vista colocados à mesa.
Ambas as correntes têm aliados de peso e argumentos capazes de endurecer a queda
de braços. Embora salutar, esse equilíbrio de forças pode adiar
indefinidamente, ou até mesmo inviabilizar, um consenso em torno da ideia.
Partindo do raciocínio de que crueldade e covardia não têm época para serem
praticadas, o início da maioridade penal poderia até ser mantido em 18 anos.
Entretanto, os benefícios do ECA valeriam apenas para o primeiro delito
cometido pelo menor. Na reincidência, ou quando já de início praticasse crime
hediondo, ele seria tratado como qualquer bandido.
Bem argumentada, e havendo boa vontade, essa sugestão talvez pudesse ser
encaminhada a título de simples aperfeiçoamento da legislação vigente, sem
envolver maior mudança na Carta Magna.
Não
se pretende fazer uma omelete sem quebrar os ovos. A intenção é, o quanto
antes, evitar que cresça a diferença entre os bons tempos em que era fácil
pegar balas de crianças e os dias atuais, quando ficou difícil fugir das balas
da gurizada.
A questão é complexa, mas, como
sentenciou o sábio Barão de Itararé, "tudo seria fácil, se não fossem
as dificuldades”.