Até momento, o governo surfou sobre sofismas e inverdades que a conjuntura
atual desnudou em toda a sua amplitude.
Ficou claro que a onda de desenvolvimento, conquistas sociais e
estabilidade econômica, alardeada nos últimos 13 anos, está bem mais próxima da
ficção do que da realidade. Alguma coisa se fez, mas muito menos do se
esperava, do que foi prometido e, sobretudo, do que tem sido propalado.
Com a vaca no brejo, atolada até o pescoço e esperneando para não morrer
sufocada, a verdade veio à tona. A nação atravessa um dos piores momentos de
sua história. Tudo resultado de falhas administrativas, falcatruas e
bandalheiras que há muito vinham sendo cometidas. Mazelas que, entretanto, só
se tornaram conhecidas depois que a imprensa e a justiça conseguiram expor e
atacar o megaprocesso de corrupção que corroia as entranhas do país.
De repente, todas as adversidades entraram em evidência. Desemprego,
recessão econômica, inflação incontrolável, dólar em forte alta, antagonismos
políticos, descrença nos governantes e outros males se irmanaram na construção
do caos.
Assustado, desorientado e percebendo que o agravamento da crise é tão
incontrolável quanto à insatisfação popular, o governo tem recorrido a todos os
meios, na tentativa de reverter esse quadro.
Na prática, entretanto, não fez
mais do que lançar um plano de ajuste fiscal que evolui na base de um passo à
frente e dois atrás, graças ao clima de beligerância que se instalou entre o
Executivo e o Legislativo.
Nada melhor do que um arrocho, um bom aperto, para colocar as coisas nos
seus devidos lugares.
Quando menos se esperava, o governo dá sinais de que mudou de postura.
Nada de arrogância, intransigência, autocracia e outras atitudes que denotem
superioridade ou autoafirmação. O negócio, agora, é mostrar humildade,
disposição para o diálogo, respeito aos adversários e, se necessário, até fazer
uma espécie de “mea culpa” premiada.
Uma boa demonstração nesse sentido foi dada pelo ministro-chefe da Casa
Civil, Aloísio Mercadante. Em conversa com o deputado Rodrigo de Castro
(PSDB/MG), ele admitiu que o governo cometeu erros e
pediu apoio da oposição à responsabilidade fiscal. Sem mudar de cara, disse que
“vivemos um momento politizado, com erros que cometemos, e se comete quando se
governa. Vocês têm experiências importantes na administração de estados e do
Brasil e precisamos ter pactos de política de estado que vão além do governo". Uma pérola de
discurso!
Trilhando
a mesma linha, o vice-presidente e articulador político do governo, Michel
Temer, falando a senadores, reconheceu que o país enfrenta uma grave crise
política e econômica. Segundo ele, a situação
“é grave porque há uma crise política se ensaiando. Há uma crise
econômica que está precisando ser ajustada. Mas, para tanto, é preciso contar
com o Congresso Nacional. É preciso contar com os vários setores da sociedade
brasileira”. Até parece!
A
metamorfose é válida, mas um tanto tardia.
A julgar pelos 71% de reprovação da presidente Dilma Rousseff,
percentual maior do que os 68% atribuídos a Fernando Collor, às vésperas de seu
“impeachment”, não há nada que permita qualquer otimismo em relação ao futuro
do atual governo.
Na verdade, o país atravessa uma crise parecida com a do casal que está
se separando, por motivo de traição de uma das partes. Filhos, familiares e
amigos, desolados, tudo fazem no sentido de impedir a ruptura. Mas a decepção
do cônjuge traído é semelhante à de um povo que não mais suporta conviver com um
ente que não soube corresponder à sua confiança.
Fica difícil. Pra caramba!
- Diário do Rio Doce