sábado, 5 de outubro de 2013

INCONGRUÊNCIAS EXPLÍCITAS

            Há muito o brasileiro vem convivendo com a triste constatação de que quantidade não é sinônimo de qualidade.
            Vários são os setores onde a relação custo/benefício é inteiramente negativa, onde o grau de satisfação está muito aquém do gigantismo das estruturas e dos fatores responsáveis por produzir resultados. O enorme descompasso entre o esperado e o obtido contraria todas as lógicas.
            O Brasil tem um amontoado leis, para tudo e para todos. Batedores de carteira, ladrões de galinha, trombadinhas e até criminosos do colarinho branco são passíveis de enquadramento.
Segundo estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), divulgado há dois anos, desde outubro de 1988, quando surgiu a atual Constituição Brasileira, foram editadas quase cinco milhões de normas federais, estaduais e municipais. Isso significa que, ao longo de 23 anos, o cidadão ficou sujeito a mais de 500 novos normativos/dia, número que gira em torno de 800, se considerados apenas os dias úteis.
            Era de se esperar que essa volumosa legislação assegurasse um país bem mais tranquilo, com menos violência urbana, menor criminalidade e – quem dera! – livre de corrupção. Um local mais justo, onde os infratores, ricos ou pobres, fossem punidos da mesma forma, sem subterfúgios e protelações. Doce ilusão!
            O aumento da frota de veículos faz a alegria de fabricantes, montadoras, revendedores e outros envolvidos no ramo, além de turbinar a arrecadação de tributos. Nada disso, entretanto, tem contribuído para melhorar o trânsito. Na contramão desse crescimento, o conforto e a segurança do cidadão são cada vez menores. Pouco se investe na manutenção e modernização de ruas, avenidas e rodovias não raro ultrapassadas, que, desgastadas pelo tráfego intenso, continuam sendo palco de trágicos acidentes.  Outra incongruência.
            Se o que recebe em troca correspondesse ao peso da carga tributária imposta pelo Governo, o povo brasileiro seria, talvez, o mais bem servido e privilegiado do planeta. No entanto, enquanto paga impostos extorsivos, tem que se conformar com serviços públicos insuficientes e a cada dia piores, mormente nas áreas de saúde, transporte e segurança, onde o caos reina absoluto.
            No campo político-administrativo, a incoerência se torna mais visível. Além dos felizardos integrantes do Congresso Nacional, o país sustenta 27 governadores, seus vices, uma infinidade de deputados estaduais, prefeitos, vereadores e seus milhares de apadrinhados. Com tanta gente disponível, não deveria haver demandas reprimidas, obras em atraso, serviços mal executados, processos engavetados, nada que pudesse colocar em dúvida a competência dos que são pagos pelo contribuinte. Mas, para tristeza geral, a folha de pagamento cresce na razão inversa dos resultados.
            Para completar, o sistema político brasileiro abriga 32 partidos, e só não chegou a 33 porque o Tribunal Superior Eleitoral decidiu rejeitar o registro do Rede Sustentabilidade, pretendido pela ex-Senadora Marina Silva.
            Nesse particular, não há muito o que comentar, tampouco lamentar. Até o Ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, admitiu que “nenhum sistema político funciona bem com 10, 12 ou 15 partidos políticos, muito menos com 30 partidos”. Onde não há ilusão, inexiste decepção.
 
* Jornal de Domingo
* Diário do Rio Doce
 

 

 

domingo, 29 de setembro de 2013

REAÇÕES ADVERSAS

            É realmente árdua, complexa e inglória a tarefa de governar.
Por mais que o mandatário se esforce, não consegue agradar a gregos e troianos.  Suas decisões e atitudes estão sempre sujeitas a divergentes avaliações e a não menos distintas reações.
O que para uns representa firmeza, determinação e heroísmo, para outros não passa de exibicionismo, insegurança ou bravata.
Vaia-se, quando normal seria aplaudir; absolve-se, quando o certo era condenar, ou faz-se simplesmente o contrário, tudo em função de interesses próprios nem sempre confessáveis.
Foi o que ocorreu com a atuação de Dilma Rousseff, na 68º Assembléia Geral da ONU.
No discurso de abertura do evento, a presidente deu um forte puxão de orelhas em Barack Obama. Em tom enérgico, acusou os EUA de, com seus programas de espionagem, praticarem ação ilegal e antidemocrática, violando o Direito Internacional, os direitos humanos, a soberania dos países e as liberdades civis.
Para o The Guardian, jornal britânico que publicou as primeiras revelações do escândalo de espionagem da Agência de Segurança Nacional (NSA) americana, o “feroz” discurso de Dilma representou um desafio direto a Obama.
Internamente, a presidente foi elogiada até por políticos da oposição. O senador Álvaro Dias (PSDB/PR), por exemplo, achou que ela agiu corretamente, embora, não baste falar sem adotar procedimentos concretos.
Também o líder do DEM, José Agripino (RN), elogiou o tom enérgico do discurso, mesmo acreditando que Dilma atuou apenas na superfície, apegada a orientação de marqueteiros.
Já o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB/PE) classificou como altamente decepcionante, fraco e ridículo o pronunciamento.
Outro a reprovar foi o deputado Ronaldo Caiado (DEM/GO). No seu entendimento, “a postura dela está mais midiática e eleitoreira do que de defesa do país”.
Conhecedor de buracos de fechaduras, binóculos, periscópios, olheiros, detetives particulares, fiscais da receita, outros meios e agentes de espreita, o povo também ficou dividido, mas não deu muita bola. Sabe que a espionagem é tão velha quanto a desconfiança entre homem e mulher. Fatores supervenientes apenas contribuíram para aumentar a indiscrição. Pelo visto, o verbo espionar continuará sendo conjugado em todos os seus tempos e pessoas. Doa em quem doer!
Resta lamentar que Obama, sabedor de tantos segredos da vida brasileira, ainda não tenha revelado onde estão Elisa Samúdio e Amarildo. Bom enredo para um novo 007.