sábado, 7 de dezembro de 2013

SURPRESAS E ESPERAS

            Seja pelas características pessoais ou por influência do calor, houve gente que surpreendeu nos últimos dias.
            Um deles foi o ex-ministro José Dirceu. Já com carteira assinada, dispensou um emprego de polpudos R$ 20 mil mensais para trabalhar como gerente do luxuoso Hotel Saint Peter, em Brasília. Segundo seu advogado, sentindo-se vítima de um linchamento midiático, ele assim procedeu “para diminuir o sofrimento dos empresários que lhe fizeram a oferta". Certamente referia-se ao panamenho José Eugênio Silva Ritter, um humilde auxiliar de escritório, lavador do próprio carro, que preside a Truston International Inc, controladora do cinco estrelas. Comovente!
            Para Dirceu, entretanto, que disse querer trabalhar “por necessidade”, não haverá problema: uma cooperativa do Distrito Federal, dedicada à ressocialização de presos, já lhe ofereceu R$ 508,50 mensais, para administrar a fabricação de artefatos de concreto. A proposta, protocolada no STF, se estende a Delúbio Soares (não como tesoureiro, sim como assistente de marcenaria, salário igual ao de Dirceu) e a José Genoíno (costurar bolas de futebol, ganhando R$ 5 por unidade). Resolvido!
            O ex-presidente do PT foi também protagonista de outro episódio inusitado. Quando todos esperavam que, de punhos erguidos, fosse lutar contra um eventual processo de cassação, Genoíno renunciou ao mandato. Na carta que encaminhou à Câmara, disse que “entre a humilhação (de ser cassado) e a ilegalidade prefiro o risco da luta e renuncio ao mandato”. A luta, pelo visto, será agora por um laudo médico que lhe garanta aposentadoria por invalidez e justifique que seja mantido no regime de prisão domiciliar em que se encontra.
            O deputado Valdemar Costa Neto, outro mensaleiro condenado, resolveu imitar Genoíno. Ordenada a sua prisão, abdicou do mandato, “para não impor ao Parlamento mais um constrangimento institucional”. Um inesperado gesto de grandeza!
            Quem de fato deixou todo mundo boquiaberto foi o ministro dos Esportes, Aldo Rebelo. No cenário paradisíaco da Costa do Sauípe, onde o sol escaldante pode ter-lhe afetado o neurônio, ele surfou na imaginação.
            Falando sobre os atrasos na conclusão dos estádios para a Copa de 2014, comparou isso a um casamento.
            “No Brasil há uma instituição muito respeitada, o casamento”, disse o ministro. “É uma festa para duas pessoas. Geralmente um noiva e um noivo. 100% a noiva chegou atrasada. Nunca vi uma noiva chegar na hora. Nunca vi um casamento não acontecer por isso", arrematou.
            Na fantasia de Rebelo, o Brasil seria a noiva retardatária, a Fifa o noivo de plantão, e a Copa o casamento esperado.
            Foi uma forma espirituosa de admitir que alguns estádios não serão entregues no prazo estabelecido.
            O ministro quase acertou na analogia. Faltou-lhe observar que não se trata de demora da noiva, sim da construção da igreja. Haverá casamento?

domingo, 1 de dezembro de 2013

PLANOS NA BERLINDA

            O assalariado brasileiro, sobretudo o mais modesto, não se amarra muito ao noticiário econômico. Faltam-lhe tempo para acompanhar, conhecimentos para entender e razões para acreditar no que é divulgado. Mas sabe quando está sendo lesado.
Para ele importa preservar o que é seu, sem prejudicar o equilíbrio entre o que ganha e os gastos com sustento da família, aluguel, escola, plano de saúde, transporte, serviços públicos e outros compromissos, além de exorbitantes impostos. Se pelo menos houver empate, tudo bem; do contrário, lascou-se.
            Quando, por milagre, sobra algum trocado, a tendência é abrir uma caderneta de poupança, pensando no futuro. Tornou-se a melhor alternativa, por ser uma aplicação teoricamente imexível, inclusive nos seus rendimentos.
            Mas houve momentos em que ficou o dito pelo não dito. Nos planos econômicos Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor II (1991), o governo recorreu a congelamentos que também afetaram os índices da caderneta de poupança. Meteu a mão em dinheiro alheio.
            A reação foi grande. Muitos poupadores foram à justiça, para questionar os novos cálculos. Os números são contraditórios, mas entre individuais e coletivas, existem milhares de ações tramitando nas diferentes instâncias do Judiciário.
            Há controvérsia quanto ao montante a ser pago aos poupadores, caso o Supremo Tribunal Federal (STF) decida pela inconstitucionalidade daqueles planos. Nas contas do Banco Central, ficaria em torno de R$ 150 bilhões. Mas o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor vê exagero nessa estimativa. Segundo seus cálculos, seriam pouco mais de R$ 8 bilhões.
            Durante anos, essas ações mereceram pouca atenção dos reclamados, que quase não acreditavam na possibilidade de elas prosperarem. Equivocados, e chegada a hora de a onça beber água, entraram em desespero; fazem de tudo para se livrar de uma pesada derrota.
            O medo é tanto que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, procuraram os ministros do STF, para tentar convencê-los de que uma eventual decisão favorável aos poupadores poderá acarretar graves perdas econômicas. Isso o povo está vendo e talvez até compreenda: a defesa faz parte do jogo.
Inaceitável, entretanto, é o acintoso lobby que vem acontecendo através dos meios de comunicação, com o indisfarçável propósito de confundir a opinião pública e forçar uma decisão em favor dos banqueiros.
            Jornais e revistas dos últimos dias estamparam afirmações de que uma vitória dos poupadores, se confirmada, ameaçaria o sistema financeiro, com risco de quebradeiras. Afora outros argumentos alarmantes, chegou-se ao descaramento de criticar o fato de os R$ 150 bilhões deixarem de ser lucro, para transformar-se em prejuízo dos bancos, assim descartando o recolhimento de R$ 60 bilhões de imposto de renda e outros tributos. Quanto a isso, os defensores do calote certamente desconsideram que o governo tem faturado sobre esses valores, enquanto estão em poder dos bancos. E continuará faturando, à medida que, devolvidos a seus legítimos donos, forem injetados na economia.
Outra vez o Brasil corre o risco de mostrar ser um país onde os pequenos só ganham quando perdem pouco.
Os homens do dinheiro, habituados a expressivos lucros, não podem sofrer prejuízos. Os assalariados, aposentados e outros pequenos aplicadores podem. Impossível entender, tampouco aceitar!
            Ainda bem que a questão está nas mãos do STF, onde começou a ser julgada, na última quarta-feira. Ali o presidente Joaquim Barbosa tem se mostrado implacável justiceiro. Não se curvou diante de prepotentes mensaleiros, e também não o fará perante gananciosos banqueiros. É no que se confia!