quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

TEMPO DE MUDANÇA


Por Etelmar Loureiro

- Revista “Mais Mais PERFIL” – Dez-2018

            De olho no calendário, o povo brasileiro conta nos dedos os dias que faltam para terminar o ano. Essa época é naturalmente marcada por um clima emocionante, em que despedidas, expectativas e ansiedades se misturam. Desta vez, um novo ingrediente se junta à fórmula, tornando mais tensa e intrigante a temporada.
            Nada que coloque em risco o especial de Roberto Carlos, as trocas de presentes e mensagens de época, os comes e bebes próprios do tempo de manjedoura, tampouco as queimas de fogos que agitam a virada de ano. Tudo isso certamente acontecerá, conforme mandam as tradições. O suspense também não se deve ao fim do governo Temer. Esse está se despedindo em silêncio e da forma melancólica como transcorreu, sem deixar saudade.
            O que está mesmo roubando as atenções é a posse do 38º presidente da República Federativa do Brasil, Jair Bolsonaro, prevista para o primeiro dia de janeiro próximo. Tornando-se cada vez mais cintilante, a estrela de Bolsonaro vem ofuscando todas as demais. Após a significativa vitória que obteve nas urnas, quase não se fala em outra coisa. Os holofotes estão voltados para aquele que, de um momento para outro, se transformou em símbolo nacional.
Sobre qualquer outro sentimento, paira no ar uma grande esperança de que o futuro governo possa colocar freios na enorme corrupção e na descontrolada criminalidade que assolam o país. Espera-se que, a um só tempo, ele consiga coibir os desmandos administrativos, as orgias políticas, as negociatas entre agentes de governo, seus aliados e fornecedores, o tráfico de drogas, o contrabando, e tantas outras mazelas que mancham o currículo nacional.
O próprio Bolsonaro, na apresentação do seu plano de governo, denominado “O Caminho da Prosperidade”, prometeu uma gestão “decente, diferente de tudo aquilo que nos jogou em uma crise ética, moral e fiscal. Um governo sem toma lá dá cá, sem acordos espúrios. Um governo formado por pessoas que tenham compromisso com o Brasil e com os brasileiros”.
A sua intenção é fazer uma administração liberal democrata, onde educação, saúde e segurança tenham prioridade. Na sua visão, o liberalismo “reduz a inflação, baixa os juros, eleva a confiança e os investimentos, gera crescimento, emprego e oportunidades”. Outro propósito é ter “tolerância zero com o crime, com a corrupção e com os privilégios”. Isso sem falar na redução do número de ministérios e extinção da abundância de órgãos hoje mantidos apenas com o objetivo de lotear o Estado e acomodar apadrinhados políticos. Ou seja: o homem que para muitos é um “mito” pretende mudar radicalmente a forma de conduzir o paísSe conseguir, será também um herói.
Claro que não será fácil levar a cabo tão ambicioso projeto, sobretudo num contexto onde, além dos entraves legais, a arraigada polarização entre vencedor e vencidos ficou longe de ser eliminada pelo resultado das urnas.  Remanesceu uma oposição que promete ser vigorosa, liderada por alto número de lulopetistas, que não hesitará em complicar a vida do capitão.
De outra parte, certo de que nem tudo são flores, o povo não esconde algum temor em relação às medidas “um pouco amargas” mencionadas mas ainda não  inteiramente reveladas por Bolsonaro. Lembrando-se de Fernando Collor, que no primeiro dia de seu governo confiscou os depósitos bancários, inclusive as cadernetas de poupança dos brasileiros, não falta quem esteja com um pé atrás. Afinal, um sábio ditado ensina que “cão mordido por cobra tem medo de linguiça”.
Mas a hora é de acreditar, ainda que não convenha colocar todas as fichas numa mesma jogada. Vale a pena reservar algumas, para, se houver chance, arriscar de novo.
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quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

AINDA HÁ CHANCE


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 06.12.2018

                Resta pouco tempo para o Brasil virar mais uma página de sua agitada história republicana. Na contagem regressiva, o presidente Michel Temer limpa as gavetas, faz as malas, e se apronta para, no dia 1º de janeiro, passar o bastão a Jair Bolsonaro. Espera-se que isso marque o fim de um dos períodos mais conturbados da vida nacional.
            Como se recorda, Temer, até então vice-presidente, assumiu a Presidência em 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff. A troca de comando aconteceu num clima de euforia e otimismo. Não que o povo gritasse “#quero Temer”, mas o “#fora Dilma” fazia com que qualquer substituto fosse bem-vindo.
Esse entusiasmo, entretanto, foi efêmero. Logo pipocaram acusações contra o novo presidente, seus aliados e auxiliares mais diretos, todos suspeitos de envolvimento em escândalos, negociatas e falcatruas do arco da velha. As duas primeiras partiram do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que denunciou o chefe do governo por crimes de corrupção passiva, organização criminosa e obstrução da justiça, no âmbito da Operação Lava Jato. Ambas foram barradas pela Câmara dos Deputados, ficando assim impedidas de prosseguir no STF. Mas surgiram outras graves incriminações, feitas pela Polícia Federal, que indiciou o presidente por lavagem de dinheiro e corrupção. Tudo isso estará paralisado, enquanto Temer estiver no cargo. Depois, só Deus e a Justiça saberão como agir.
Esses e outros rolos contribuíram para que, a certa altura, com apenas 7% de aprovação, Temer fosse considerado o presidente mais impopular desde a redemocratização do país, e o mais rejeitado do planeta.
Se em termos éticos o governo Temer sofre questionamentos, o mesmo não se pode dizer com relação à sua performance administrativa. Não fez maravilhas, mas realizou um básico satisfatório. Entre os seus méritos, reconhecidos até por seus adversários, estão o controle da inflação, a queda da Taxa Selic e a reforma do ensino médio. Há quem inclua nesse rol a reforma trabalhista e a PEC do Teto (que estabelece limites para os gastos públicos pelos próximos 20 anos), mas quanto a isso as opiniões se dividem.
Em recente entrevista concedida à revista Época, Temer emitiu algumas afirmações e considerações interessantes. Disse que ninguém fez mais do que ele por estados e municípios. Lembrou também que, após assumir, o PIB cresceu de 6 pontos negativos para 1 ponto positivo, “ou seja, caminhamos 6,9 em um ano e meio”. No seu entendimento, os livros de história o tratarão primeiro como um “injustiçado” e depois como um estadista. Mas, ao ser indagado se acreditava que os brasileiros sentiriam falta de seu governo, respondeu: “Espero que não. Porque se sentirem falta, é porque o próximo será ruim, e não quero isso”.
Um dos presentes na entrevista lembrou uma frase de Fernando Henrique Cardoso, segundo a qual o governo Temer não era uma “ponte para o futuro”, como dizia o MDB, mas sim uma pinguela, que corria o risco de quebrar. O presidente rebateu: “atravessei soberanamente a pinguela. E ela se revelou uma ponte vigorosa”.
No esporte, é normal um atleta passar maior parte do tempo recebendo vaias, e se consagrar nos momentos finais da competição, fazendo uma jogada de gênio. Temer parecia caminhar nessa direção, até que novamente pisou na bola com a opinião pública, sancionando o reajuste salarial de 16,38% para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e para o procurador-geral da República. O tempo é curtíssimo, mas ele ainda tem chance de ficar bem na foto. Afinal, o jogo só termina com o derradeiro apito, e, segundo os sábios, a última impressão é a que fica. Basta saber produzi-la.


quinta-feira, 22 de novembro de 2018

MESES COLORIDOS


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 22.11.2018

                O mês de outubro foi marcado pela campanha de conscientização da sociedade, em particular as mulheres, sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama.
            Carinhosamente chamado Outubro Rosa, o movimento originou-se em Nova York, na primeira Corrida pela Cura, realizada em 1990. Desde então, vem acontecendo em várias partes do mundo, de forma cada vez mais intensa e representativa.
            Seu símbolo é o laço rosa, que representa a luta contra a doença e estimula a união das pessoas, empresas e entidades em torno da causa. A iluminação rosa, quando projetada sobre monumentos e prédios públicos, é emblemática em qualquer parte do planeta.
            Depois do Outubro Rosa, é a vez do Novembro Azul. O penúltimo mês do ano tornou-se mundialmente reservado a ações ligadas ao câncer de próstata e à saúde dos “machões”. A ideia nasceu na Austrália, em 2003, inspirada no Dia Mundial de Combate ao Câncer de Próstata, celebrado em 17 de novembro.
            No Brasil, o movimento já faz parte do calendário nacional das campanhas de prevenção. Tem o objetivo de combater o mal e, sobretudo, motivar a galera masculina a submeter-se aos exames de praxe, inclusive a temida e, para muitos, humilhante “dedada”.
            Semelhante ao que acontece no Outubro Rosa, há distribuição de lacinhos e iluminação dos marcos e pontos turísticos das cidades, tudo na cor azul (o que alguns cruzeirenses, este ano, entendem ser também homenagem a seu time, pela conquista do hexa da Copa do Brasil).
            O Outubro Rosa sempre repercute mais do que o Novembro Azul, graças ao maior engajamento, à melhor disciplina e à mais apurada intuição da mulher em relação aos cuidados para com saúde.
            No cômputo geral, entretanto, ambas as temporadas têm cumprido sua finalidade. Está cada vez mais difícil alegar inadvertência ou ignorância quanto à necessidade um “check-up” periódico.
            O resultado tem sido tão auspicioso que a “colorização” poderia se estender a mais meses, na tentativa de estancar outros males que afligem a sociedade.
            Boa ideia seria instituir o Dezembro Verde-Amarelo, inspirado no Dia Internacional de Combate à Corrupção, ao qual é reservado o 9 de dezembro.
            Em clima de manjedoura, o mês do Natal acomodaria também implacável campanha contra os “maus hábitos” cultivados por empresários, políticos e autoridades de todo o mundo, com justificada ênfase para a turma do “patropi”.
            Para maior interação dos festejos da época, a cauda da Estrela Guia teria as cores da seleção canarinho, enquanto a iluminação, no mesmo tom, se estenderia a todos os presídios do país.
            Maquetes de presépios seriam colocadas nas penitenciárias, onde os Reis Magos, em homenagem aos “hóspedes”, chegariam trajando o honroso modelito listrado.
            Papai Noel, incorporado pelo ex-juiz e agora futuro ministro Sérgio Moro, abandonaria seu tradicional trenó. Apareceria pilotando um robusto e aconchegante camburão, preparado para acomodar corruptos de qualquer tribo.
            De início, apenas o símbolo do movimento seria trocado. O lacinho cederia lugar a delicadas algemas, compostas de uma argola verde e outra amarela.
            A Polícia Federal, como de praxe, se encarregaria de animar a festa.
            Lançada a ideia!


quinta-feira, 8 de novembro de 2018

TRÊS DÉCADAS DE DEMOCRACIA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 08.11.2018

            Com a atenção voltada para os desdobramentos das eleições deste ano, o brasileiro quase não se deu conta do 30º aniversário da Constituição Federal vigente. Por sorte, a data foi celebrada pelo Congresso Nacional, na última terça-feira (06), em cerimônia da qual participaram os presidentes dos três poderes e outras autoridades. A bem da verdade, entretanto, o que mais realçou no evento foi a presença do presidente eleito, Jair Bolsonaro, marcando o início do processo da transição do governo de Michel Temer para o dele.
            A atual Carta Magna resultou da Assembleia Nacional Constituinte instalada em 01.02.1987, com o objetivo de produzir uma Constituição democrática para o país. Era uma promessa de campanha presidencial de Tancredo Neves, que, eleito, morreu antes de assumir o cargo. Em seu lugar, José Sarney foi empossado, e honrou o compromisso. Presidida pelo deputado Ulysses Guimarães, essa Assembleia trouxe muitas mudanças, fruto de um trabalho que durou 20 meses e teve a participação de 559 parlamentares, sendo 72 senadores e 487 deputados federais.
Desde sua independência, o Brasil teve sete constituições. Nenhuma delas, porém, esteve tão aberta à opinião pública como a atual. Tanto assim que o Congresso Nacional recebeu em torno de 120 emendas, assinadas por mais de 12 milhões de populares.
                A promulgação do texto constitucional aconteceu no dia 05 de outubro de l988, em uma histórica sessão solene do Poder Legislativo. Naquela data, após assinar os originais da nova constituição, Ulysses Guimarães se levantou da cadeira, empunhou um exemplar e, em memoráveis palavras, proclamou “o documento da liberdade e da dignidade. Da democracia. Da justiça social. Do Brasil”. Esse se transformou num dos momentos mais importantes de nossa história, em que o povo brasileiro, marcado pela repressão dos 21 anos de regime militar, pactuou o início de um novo tempo.
A Constituição Cidadã, como Ulysses a chamou, tornou-se emblemática do processo de redemocratização do país, assegurando a liberdade de pensamento e criando instrumentos para evitar excessos de poder do Estado.  Além disso, estabeleceu a independência dos poderes constituídos, com voto direto para a eleição de presidente, governadores e prefeitos.
            Promulgada com 245 disposições permanentes e 70 transitórias, ela, ao longo do tempo, foi modificada mais de 100 vezes, um recorde que divide opiniões.   
            Para Gilmar Mendes, ministro do STF, “há excesso de emendas constitucionais no Brasil. Isso decorre de um modelo constitucional, que é um texto analítico, e um texto analítico acaba provocando emendas. Nenhuma emenda constitucional, no entanto, foi feita para atacar cláusulas pétreas”.
            Por sua vez, Carlos Ayres Britto, ex-ministro do mesmo STF, considera esse número elevado. Para ele, não havia necessidade de tanta emenda. Britto, entretanto, pontua que “o que nos cabe é nos convencermos de que ela é de excelente qualidade. Nos torna um país juridicamente primeiro-mundista. A mais democrática de todas as nossas constituições, seja no seu processo de elaboração, seja no seu conteúdo. Fez da democracia o princípio dos princípios”.
            Os 30 anos de nossa Lei Maior se completam no momento em que o Brasil acalenta sonhos de novos tempos, a partir de uma mudança de governo em que todos depositam enorme esperança.
            No entendimento do ministro Edson Fachin, outro integrante do STF, "a última palavra na sociedade democrática não é de juiz, mas da própria sociedade que constrói e reconstrói seu contrato social e o projeta para a ordem normativa".
            Sábia e oportuna, essa reflexão enfatiza a necessidade de se preservar uma Constituição que valha para todos, pois disso depende uma nação democrática que busque a justiça e a igualdade social. Nosso caso!


quinta-feira, 25 de outubro de 2018

NA RETA DE CHEGADA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 25.10.2018

            Mais três dias, e o Brasil conhecerá o seu próximo presidente.
            A campanha política deste ano contrariou as mais abalizadas previsões. Depois de uma modorrenta largada, transformou-se em acirrada disputa, num clima de quase beligerância. Em todos os momentos, sobretudo no segundo turno, o desrespeito, a troca de farpas e agressões, as mentiras, as tentativas de desconstrução entre os adversários e muitas outras baixarias têm prevalecido sobre a apresentação de projetos e a discussão dos grandes temas de interesse nacional. Um ambiente surreal, onde as “fake news” e as tramas de bastidores repercutem muito mais do que os arranjos de vitrine.
            Neste cenário, as redes sociais vêm dando verdadeiro banho na TV, na propaganda eleitoral gratuita e até mesmo nos debates e sabatinas com candidatos. Na visão de Daniel Machado, especialista em marketing político, “há um descontentamento com o político tradicional e isso reverbera também no modelo de se fazer campanha”. E é bom que os eleitores estejam preparados para as surpresas e pegadinhas que poderão pintar no apagar das luzes. Sempre há tempo para mais uma sacanagem!
            Desde o primeiro turno, instalou-se uma forte polarização entre petismo e antipetismo, centrada nos dois candidatos que se mantiveram na pista. Cada uma deles conta com a simpatia e o apoio de um exército de seguidores autênticos e leais. Mas há muitos eleitores que não simpatizam com nenhum dos dois.  Entre esses, uns votarão em Haddad, apenas defender conquistas sociais e democráticas que imaginam estar ameaçadas. Outros vão de Bolsonaro, para impedir que o PT retorne ao governo, trazendo consigo todas as mazelas que tanto afligiram o Brasil, nos 13 recentes anos em que ele esteve sob o comando petista. No fundo, ambos se inclinam pelo que julgam ser o menos ruim.
            É entre a cruz e a espada que o brasileiro chega à reta final das eleições de 2018. Os analistas são unânimes em dizer que a atmosfera que abarca a competição entre os dois finalistas é a mais tensa, desde que o país foi redemocratizado. Perguntado sobre isso, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, respondeu à Rede Brasil Atual (RBA) ser apenas “um período conturbado, e que sugere uma incógnita”. Dizendo esperar que não tenhamos o pior, o magistrado finalizou a entrevista acrescentando que “eu não estou tranquilo, e julgo os demais por mim. Penso que a pessoa conscientizada não está vendo com bons olhos o contexto. Mas vamos esperar”.        
            Bem ou mal aceitas, as eleições continuam sendo o grande ponto de convergência da opinião pública. É o meio democrático pelo qual pessoas da sociedade são escolhidas para exercerem o poder que a elas é outorgado pelo povo.
Mesmo nos países onde o voto é facultativo, o processo eleitoral mobiliza as atenções populares, envolvendo acirradas disputas.
Na hora H, há os que pensam em votar em branco, anular voto ou simplesmente não comparecer. Boa forma de se rebelar contra as promessas enganosas, a demagogia, o cinismo, a incompetência, a falta de idealismo, e outras vergonhas que enodoam a campanha eleitoral.
            Seria essa a decisão mais sensata, não fosse o perigo de ela se transformar no que os contraventores da vida pública mais gostam. Na omissão dos que podem julgar se sustenta a vitória dos não merecem nem mesmo a oportunidade de competir.
            As eleições oferecem valiosa ocasião de exercer-se a cidadania, e ninguém deve abdicar desse direito. A legitimidade do processo político só será alcançada com a participação de todos.
            Ademais, segundo o filósofo Platão, “o castigo dos bons que não fazem política é ser governados pelos maus”. Palavras de sábio!

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

ELEIÇÃO DAS SURPRESAS


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 11.10.2018

            Um velho político nordestino, certa vez afirmou que o conteúdo das fraldas de bebê e das urnas eleitorais só se conhece depois que elas são abertas. De nada adiantam imaginações ou suposições. Só abrindo, pra ver.
            A tese é antiga, mas permanece na ordem do dia, válida e incontestável.
            Os resultados do primeiro turno das eleições deste ano outra vez revelaram a fragilidade e a imprecisão das pesquisas eleitorais feitas pelos institutos especializados no assunto.
            Não que elas tenham sido totalmente equivocadas. Em alguns casos, até acertaram, como na avaliação dos concorrentes à Presidência da República. Em outros, porém, incorreram em falhas lamentáveis, bastante comprometedoras da sua já abalada confiabilidade.
            Em Minas Gerais, por exemplo, houve erros inadmissíveis, causadores de surpresas e decepções que muito alteraram o cenário político estadual.
            Basta lembrar a situação de Dilma Rousseff. Durante toda a campanha, as pesquisas diziam ser ela a favorita. Por muitas noites, isso tirou o sono do enorme contingente de mineiros inconformados com a ideia de tê-la como sua representante no Senado Federal. Contados os votos, entretanto, a ex-presidente não passou de um melancólico quarto lugar, com um sufrágio inferior à metade do que foi previsto pelas pesquisas. Seus adversários ainda comemoram.
            Outra enorme divergência entre as urnas e as “profecias” aconteceu na corrida para o governo mineiro.
            No sábado anterior à votação, as pesquisas davam como certo um segundo turno entre Antonio Anastasia e Fernando Pimentel, com larga vantagem para o primeiro. Em modesto terceiro lugar, tido como carta fora do baralho, aparecia Romeu Zema, um ilustre desconhecido nos meios políticos, que jamais participou de eleições. Terminada a apuração, Zema conquistou quase metade dos votos, detonou o petista Pimentel, e vem sendo considerado favorito na briga final, contra Anastasia.  
            Em maior ou menor escala, a inconsistência das pesquisas também se fez sentir em outros importantes redutos eleitorais, inclusive Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo, onde os resultados das urnas divergiram em muito dos que foram por elas apontados.
            Alguns especialistas dizem que os institutos não erraram. Na visão do cientista político Malco Camargos, professor da Puc-Minas e diretor do Instituto Ver Pesquisa e Estratégia, “ocorre que as pesquisas captam o momento. O eleitor é perguntado para quem votaria se a eleição fosse naquele dia. E o eleitor muda de opinião”.
            Segundo o Ibope, já se esperava que pesquisas efetivadas antes da eleição mostrassem alguns resultados diversos dos apurados. “Grande parte dos eleitores são indecisos até o dia da eleição, decidindo apenas na hora da votação em quem vão votar”, ponderou o instituto, acrescentando que, por esse motivo, as pesquisas de boca de urna são as que mais refletem a realidade.
            Agora, limitada a dois os candidatos, a escolha tende a ser é mais fácil.
            Escaldado das demagogias e inverdades que lhe empurraram goela abaixo no primeiro turno, o eleitor adquiriu melhor condição de decidir.
            Por outro lado, deverá ser bem mais pressionado por institutos como o Ibope, Datafolha e outros tomadores de opinião, afora a enxurrada de verdades e inverdades que continuarão viralizando na internet.
           O momento é de ficar atento aos lances, em busca de elementos que permitam formar juízo próprio. Lembrando que as pesquisas de opinião, mesmo quando imparciais, só acertam quando erram pouco.


quinta-feira, 4 de outubro de 2018

ENTRE O GOL E A URNA


Por Etelmar Loureiro

- Revista "Mais Mais PERFIL" - setembro /2018

Comentar política, em época de eleição, já foi tão elementar e estimulante quanto falar de seleção brasileira, em tempo de Copa do Mundo. Ambas eram temporadas pródigas em novidades, novas táticas, consagração de velhos e revelação de novos talentos, disputas empolgantes, torcidas inflamadas, expectativas otimistas e outros fatores que arrebatavam torcedores e eleitores. A inspiração surgia naturalmente, facilitando a vida dos articulistas.
            O passar do tempo não eliminou essa equivalência, mas colocou-a pelo avesso. Hoje a desmotivação tomou conta dos que se dispõem a abordar esses temas.
            Quanto à seleção, as decepções vêm se acumulando desde 2002, quando, pela última vez, o Brasil conquistou um campeonato mundial. Nos 16 anos que se seguiram, exceto raras exceções, só se viu um amontoado de “astros” individualistas, tatuados, trajes e penteados da moda, cheios de mordomias e vontades próprias. Futebol, que é bom, alguns até possuem, mas não o praticam. Nada a ver com os grandes craques do passado, amantes da camisa, dotados de espírito de equipe, e sempre dispostos a dar o melhor de si por uma vitória. As consequências aí estão: trocam-se dirigentes, técnicos e jogadores, mas nada consegue restabelecer a motivação do torcedor.
            Na política, o desapontamento é o mesmo. Acabou-se a geração dos políticos geniais, que brilhavam pela inteligência, seriedade, honestidade e, sobretudo, pelo comprometimento com os interesses nacionais. Homens que colocavam a honra e a dignidade acima de quaisquer tentações ilícitas.  Homens de palavra, que honravam suas promessas. Homens que só se uniam partidariamente em torno de um ideal, nunca por conveniências pessoais. Homens que correspondiam às expectativas, e assim conquistavam a admiração e o respeito da sociedade.
            Essa saudosa elite praticamente desapareceu, ofuscada por um bando de oportunistas que, posando de sérios e travestidos de políticos, tomaram conta do país. Com inegável habilidade, amparados em costas quentes, e não raro sustentados pela corrupção, estão em todas as áreas, envolvidos em falcatruas e negociatas. Agem por conta própria, ou como herdeiros de “caciques” inescrupulosos, que tudo fazem para manter vivas as suas dinastias.
            As eleições deste ano estão longe de acalentar esperanças de grandes mudanças nesse quadro.
            A julgar pelo que demostram os concorrentes aos mais diversos cargos, “tudo continua como dantes no quartel de Abrantes”. Os discursos vazios e as promessas fantasiosas em nada se modificaram. A falta de projetos exequíveis, capazes de satisfazer às grandes necessidades nacionais, constitui, como sempre, a deficiência mais preocupante. Se algo mudou, foi a arte de mentir, que, bem maquiada pelos marqueteiros de plantão, adquiriu novos tons de desfaçatez.        
Os 13 competidores à Presidência da República se dividem entre políticos desgastados, bastante desacreditados, e estreantes que não trazem novidades, não inspiram maior confiança, tampouco demonstram plena aptidão para o cargo.
            Os prognósticos são difíceis. Por enquanto, a indecisão reina absoluta.
Caso não aconteça uma impulsiva, passional e, por isso mesmo, temerária decisão de primeiro turno, pode ser que um segundo escrutínio dê ao eleitor a chance de uma escolha mais racional.
            Há algo em comum entre o gol e a urna: ambos são perseguidos pelos que buscam a vitória. Na última Copa, o Brasil sofreu nova derrota, porque outra vez seus atletas não souberam marcar os tentos necessários. Espera-se que, agora, na hora do voto, o brasileiro seja mais “bom de bola”. Talento não lhe falta!


quinta-feira, 27 de setembro de 2018

SANTOS DE CASA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 27.09.2018

            Podem existir outros meios, outros recursos, ou outros fatores também importantes, mas, na consecução de seus objetivos, a força política é a maior arma de uma comunidade. Esse poderio não surge por acaso, nem por passe de mágica. Ele se forma, ao longo do tempo, graças ao idealismo, ao respeito às tradições e ao espírito de união daqueles que os possuem. É o somatório de virtudes que caminham lado a lado com o orgulho de fazer parte da comunidade e de saber valorizar as lideranças locais.
            Desde sempre, Governador Valadares carece de uma representatividade política mais unida, expressiva e vigorosa o bastante para se impor e brigar com êxito por suas aspirações.
Importantes conquistas fazem parte de sua história, todas dignas de aplausos.  Muitas, entretanto, deixaram de acontecer, não por desinteresse ou falta de empenho, mas por insuficiência de prestígio político.  
Para início de conversa, o município não possui uma infraestrutura econômica à altura de suas necessidades. Por insuficiência de marketing, ou escassez de incentivos capazes de atrair negócios, faltam empresas, sobretudo as de grande porte, capazes de gerar receitas e empregos, nas quantidades ideais.
Por outro lado, impõe-se a concretização de metas que há muito se arrastam nos corredores do Poder, como é o caso da duplicação da BR-381, ainda longe de ser concluída e sob a grave ameaça de não chegar a Valadares.
Também emperradas, encontram-se a plena operacionalização do aeroporto local, a vinda do gasoduto e a inclusão do município na área da Sudene. Vantagens que agregariam mais dotes ao perfil empresarial do município, que delas já poderia estar desfrutando, se contasse com uma força política capaz de remover os entraves burocráticos a que estão submetidas.
Não seria justo responsabilizar apenas os homens públicos por esse contexto.  Eles podem ser os maiores culpados, mas não os únicos. Também a comunidade tem muito a ver com isso. Afinal, é ela que elege seus representantes. Entre eles, forasteiros que, em época de eleições, se apresentam como defensores dos interesses municipais, prometem mundos e fundos, usurpam preciosos votos, e depois se mandam, deixando o povo a ver navios.
A conta sobra para os políticos “caseiros”, que, fora honrosas exceções, sem grande talento, sem cacife e sem união, pouco ou nada podem fazer.
O primeiro turno das eleições acontecerá daqui a 10 dias. Será a nova chance de essa lastimável situação ser revertida ou, ao menos, minimizada.
Verdade é que o eleitor se sente cada vez mais desmotivado. Não que esteja de mal com as urnas ou que tenha abdicado do direito de votar. Mas está exausto de balançar entre o ruim e o pior, impasse cada vez mais presente nas eleições.
Neste pleito, por sorte, o valadarense encontra-se numa posição mais confortável. Há bons candidatos que são da terra, por berço, adoção ou afinidade. Excluídos os “malas”, sobra muita gente boa. Gente conhecida, tradicional, séria e bem intencionada. Gente dedicada e batalhadora, que, apesar dos entraves, já mostrou serviços e pode fazer mais pela cidade.
Se o eleitor quiser ter uma representação política legítima, robusta e comprometida com os anseios valadarenses, a receita é prestigiar os “prata-da-casa”. Nada de dar boa vida a alienígenas oportunistas, que só aparecem na hora de garimpar votos.  
Repaginando o velho provérbio, poder-se-ia dizer que santos de casa não fazem milagres, exceto alguns que só eles conseguem fazer. É melhor não duvidar!


quinta-feira, 13 de setembro de 2018

"SONHO MEU"


Por Etelmar Loureiro


- Diário do Rio Doce - 13.09.2018

 

Em linhas gerais, curiosidade é o desejo de ver ou conhecer algo até então ignorado. É uma das características do ser humano. Quando bem dosada, ela se torna estimulante, acalentando sonhos e gerando gratas expectativas.

            Não faz muito tempo, a gravidez era uma das maiores fontes de curiosidade. Tão logo a mulher se descobria gestante, instalava-se enorme e contagiante suspense em relação ao sexo do bebê.

            Não faltavam adivinhações, palpites e prognósticos baseados em experiências, sintomas ou superstições. Promessas e apostas mobilizavam os pais, avós, outros familiares, amigos e todos os que se dividiam entre ser homem ou mulher. Velas eram queimadas, e muita cerveja foi paga por conta dessa doce incerteza.
            Não adiantava exercitar a imaginação. O resultado só era conhecido ao final de nove meses, depois de o bebê “dar as caras” e mostrar suas “credenciais”.
            O ultrassom, com cem por cento de acerto, desvendou o segredo do ventre materno. Ele acabou com as ansiedades, simpatias, dúvidas quanto às cores do enxoval, e tantas outras curtições que empolgavam o enigma do ele ou ela. Agora, com poucos meses, já se sabe se o bebê é homem ou mulher, atleticano, flamenguista ou corintiano, mocinho ou bandido, político ou gente séria. Sem risco de errar.
            Outra incógnita, que no passado também provocava grandes aflições, girava em torno dos resultados eleitorais.
            Os candidatos se apresentavam, assim como hoje, mas os medidores de opinião eram escassos e inseguros. As mudanças de cenário aconteciam, sem que pudessem ser convenientemente avaliadas.  Certeza de vitória só depois de concluída a contagem manual dos votos; coisa que a ansiedade transformava em sôfrega eternidade.
                Esse quadro só começou a se modificar em 1942, quando surgiu no Brasil o Ibope – Instituto Brasileiro de Opinião Pública, especializado em medir, por meios científicos, a audiência das emissoras de rádio que operavam no país.
            A despeito da relevância de seu trabalho, o próprio Instituto teve que superar as dificuldades iniciais, para inspirar confiança.  Os aplausos que recebia, quando os resultados agradavam, davam lugar a pesadas críticas, se as expectativas das emissoras fossem contrariadas.
A primeira pesquisa eleitoral a cargo do Ibope, entretanto, aconteceu em São Paulo, em 1945, sobre as eleições presidenciais daquele ano, vencidas por Eurico Gaspar Dutra.  
            Desde então, com o aparecimento da urna eletrônica,  e graças a pesquisas aperfeiçoadas pelo uso de técnicas e ferramentas cada vez mais modernas, a disputa entre os políticos perdeu a graça. O suspense, que mexia com o emocional do eleitor, deixou de existir.  Antes mesmo da votação, o resultado é facilmente presumível, quando não imexível.  Não há mais aquela longa e emocionante espera pela proclamação dos vencedores; a apuração acontece em questão de horas.
            As atenções agora se voltam mais para o futuro.
             Em família, a torcida é para que o recém-nascido cresça fiel ao seu gênero. Nada de trocar de lado.
            Na política, espera-se que o eleito honre os compromissos assumidos, sem se entregar às seduções do poder.
            Dois sonhos por demais ambiciosos!

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

ZEBRA NO BOLSO


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 30.08.2018

            Faltando pouco mais de um mês para o seu primeiro turno, não há lembrança de uma eleição tão prestigiada pelo desinteresse popular. Como se fosse uma retrospectiva de campanhas, só se vê a repetição de chavões e promessas surradas, feitas por candidatos também desgastados ou incapazes de gerar qualquer esperança de renovação.
            Há nada menos de 13 aspirantes à Presidência da República. Alguns são velhos conhecidos, figurinhas carimbadas. Nem mesmo com a ajuda de hábeis e onerosos marqueteiros, conseguem fugir da mesmice que torna ridículas as suas exposições.  Os neófitos também não causam empolgação, inclusive quando acenam com metas arrojadas, pois não indicam a origem dos recursos que lhes permitirão executá-las.
            Sempre depositei nas pesquisas eleitorais a inabalável confiança que tenho nos horóscopos sentimentais. Dessa vez, entretanto, elas estão se superando em termos de eficiência: entre tantos concorrentes, conseguem passar a ideia de que não há mais do que uma acirrada disputa entre dois candidatos, um de esquerda, outro de direita, cada um tentando se impor como o mais legítimo representante de sua tendência. Os demais pretendentes, com índices inexpressivos, não passam de coadjuvantes, ou meros figurantes, pelo menos por enquanto.
            De um lado está um militar da reserva, 63 anos, paulista, que cumpre atualmente seu sétimo mandato de deputado federal, o mais votado do Rio de Janeiro, nas eleições de 2014, hoje filiado ao Partido Social Liberal.
Esse é Jair Bolsonaro, político franco, polêmico, não raro irreverente, célebre por seu perfil populista e de extrema-direita, simpatizante do movimento militar de l964, contrário aos direitos LGBT, apologista do combate enérgico à criminalidade, defensor intransigente dos princípios familiares, e conhecido por muitas afirmações controversas que já lhe renderam várias dores de cabeça judiciais. Em resumo, é um misto de Silas Malafáia, Capitão Nascimento e Papa Francisco, que, dado o seu estilo diferenciado, a cada dia conquista mais seguidores.
            Na outra ponta, aparece a surreal candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, 72 anos, que, mesmo na condição de presidiário, se mantém líder nas pesquisas.
Nada ofusca o indiscutível prestígio popular do maior líder petista. Por mais que lhe façam acusações, seus apoiadores se multiplicam, crendo ser ele vítima de injustiça e perseguição. Mas, dentro do seu próprio PT, não faltam os que reconhecem ser esse um quadro que só se sustenta graças a muita “mágica” no sentido de manter em evidência o nome mais representativo da agremiação. Mesmo conscientes de que se trata de caso praticamente perdido, admitem não haver outro meio de o partido preservar-se e sair menos chamuscado do próximo pleito.
Caso Lula seja alijado do processo, e não consiga transferir maior parte de seus votos para o seu substituto, ou para os demais candidatos, haverá a possibilidade de Bolsonaro liquidar a fatura no primeiro turno. Se assim considerada, ainda que improvável, mas não impossível, a zebra já estaria no bolso.
Começa amanhã (31) a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. Por tradição, sensíveis mudanças poderão ocorrer no cenário aqui comentado, contribuindo para que a disputa fique mais competitiva e empolgante.
O sábio e saudoso político mineiro Magalhães Pinto certa vez sentenciou que "Política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já muda". A meteorologia está prevendo céu de muitas nuvens, até as eleições. Sinal de que poderão ocorrer chuvas e trovoadas.

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

UNIDOS PELO IBITURUNA

Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 16.08.2018

A mudança para os grandes centros, em busca de maiores oportunidades de estudo e trabalho, é um comportamento típico do ser humano, especialmente dos jovens.
Esgotadas suas chances nos locais onde vive, o indivíduo sai em busca de novos horizontes, deixando para trás família, namorada, amigos, objetos e locais com os quais até então conviveu. De repente, tudo vira recordações que dificilmente se apagarão, sobretudo para quem soube viver o passado.
Hoje declinante, esse movimento migratório teve sua fase áurea nos anos 1950/70, quando os cursos superiores existiam apenas nas capitais e em algumas localidades mais adiantadas.
Foi nessa época que muitas famílias de Governador Valadares assistiram ao êxodo de seus filhos.  Após concluir o então chamado segundo grau, eles não tiveram alternativa, senão fazer as malas e partir para onde pudessem prosseguir seus estudos. E assim se espalharam por Belo Horizonte, Vitória, Rio, São Paulo e outras metrópoles, inclusive do exterior. Ali lá se formaram, se estabeleceram, constituíram família e acabaram criando raízes. Nos quatro cantos do mundo, é possível encontrar valadarenses notáveis e bem sucedidos, nas mais diversas áreas.
 Muitos desses “emigrantes”, agora na faixa dos 70 anos, embora dispersos, conseguem manter um estreito relacionamento entre si, como se nunca houvessem se distanciado uns dos outros.
Entre os diferentes modos de manter essa sadia convivência, eles formam no WhatsApp um grupo, já bem numeroso, que se comunica de forma constante, falando de amenidades, família, política, esporte, humor, sacanagem, viagens e tudo o mais que possa agregar valores e perenidade à confraria.
            A explicação para tanto entrosamento poderia se resumir nos laços de amizade que ligaram esses personagens na infância e na juventude, quando eram vizinhos ou integravam a mesma tribo. Mas há outro forte elo, que inclusive contribui para que o grupo se torne cada dia mais numeroso: o Colégio Ibituruna, onde, na década de 1960, eles cursaram o primeiro e segundo graus.
´           É surpreendente a influência desse educandário sobre o emocional de seus alunos. Mesmo após muitos anos de separação, as salas de aula, os professores, os colegas, os desafios, as brincadeiras, as rusgas e emoções sobrevivem na memória de todos, alimentando um espírito de união que se fortalece com o passar do tempo.
            Não se contentando com o simples contato virtual, essa turma partiu para um corpo a corpo periódico, com direito a comes e bebes, camiseta, muita alegria e nenhuma influência política. Isso já aconteceu duas vezes, ambas na capital mineira.
            Neste ano, coincidindo com 80º aniversário de fundação do Colégio Ibituruna, o encontro será em Governador Valadares, nos dias 14 e 15 de setembro próximo. Esperam-se mais de 100 participantes, muitos dos quais virão de várias partes do país.
            A programação, a cargo de um grupo coordenador, inclui duas festivas reuniões etílico-gastronômicas, uma missa de agradecimento e homenagens presenciais e “in memoriam” a algumas personalidades ligadas à escola.
            Embora de natureza informal, o evento é da maior importância. Além do desejo de confraternização que o motiva, ele oferecerá aos ex-alunos, em especial os que vêm de fora, a rara oportunidade de um reencontro com velhos amigos e com o colégio onde iniciaram a caminhada rumo ao sucesso. Haja coração!

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

ROYALTIES PROVIDENCIAIS


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 02.08.2018

            O Fórum Emergencial de Saúde e Educação acontecido em Governador Valadares, no último dia 27, do qual participaram cerca de 40 prefeitos de cidades mineiras, mostrou um compartilhamento de problemas e dificuldades bem mais preocupantes do que se pensava.
O evento serviu para desnudar, em toda a sua extensão, a aflitiva situação financeira em que se encontram aqueles municípios, devido à falta de repasses por parte do Governo mineiro. A inadimplência do estado se refere a verbas garantidas pela Constituição Federal, destinadas à saúde, educação e segurança, afora outras necessidades essenciais e inadiáveis. Dados recentes mostram uma dívida superior a R$ 100 milhões, apenas para com a prefeitura valadarense. 
            Pelo que ficou demonstrado, já há cidades com serviços comprometidos e até mesmo paralisados.
            Os prefeitos optaram por reagir com medidas enérgicas, entre elas a paralisação de todas as atividades escolares, a partir de 20.08, e a proposição de uma Ação Civil Pública, caso a pendência se mantenha.
            A queda de braços envolvendo repasses do governo de Minas para os municípios não é novidade, mas se intensificou na administração atual. E não há muita esperança de que o impasse se resolva a curto prazo.
            A experiência ensina que nas situações de dificuldade é que são encontradas as melhores saídas.
            Pode ser que nem todas as prefeituras tenham conhecimento da Lei 13.540/2017, de 18.12.2017. Ela destina 15% da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), aos municípios escoadores da produção de minério de ferro, ou afetados por operações de embarque e desembarque, ou ainda para cidades onde se localizam pilhas de estéril, barragem de rejeitos e instalações de beneficiamento.
            Significa dizer que, mesmo sem possuir nem ao menos uma jazida, as localidades diretamente impactadas pela atividade mineradora passaram a ter direito a parte dos “royalties” da mineração, o que certamente aliviará os cofres municipais.
            Para que isso se tornasse possível, os municípios mineradores, que antes recebiam 65% dos royalties, ficarão com 60%. Já o Estado, que até então abocanhava 23%, terá que se satisfazer com 15%. A fatia do Governo Federal caiu de 12% para 10%.
            O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Julvan Lacerda, considera que esse foi um avanço muito importante. “Antes, esses vizinhos, apesar de sofrerem os impactos do transporte do minério e da presença das barragens, não ganhavam nada. Agora, vão ganhar”, festeja Lacerda.
            Alguns noticiários dizem que esse benefício foi instituído graças a uma emenda apresentada na Medida Provisória 789/17 pelo senador Roberto Rocha (PSDB-MA), para quem a vitória é de todos os prefeitos que se uniram para chegar a essa conquista. Segundo ele, “ao longo de décadas, a única coisa que os municípios maranhenses recebiam era o pó de minério e o apito do trem. Não ficava nada além disso”.
            A situação se equipara à do Vale do Rio Doce, onde há décadas enormes comboios da Vale percorrem dezenas de municípios mineiros e capixabas, transportando para o porto de Vitória milhões de toneladas de minério extraídas em Itabira. Tanto lá quanto cá, o legado é o mesmo.
            A partir de agora, essas cidades terão direito à recompensa pelos transtornos que lhes são impostos. Resta às autoridades competentes inteirar-se de seus direitos e correr atrás do prejuízo. Enquanto “seu lobo” não vem.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

A PRAÇA É AUREA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 19.07.2018

As cidades mais antigas e tradicionais, donas de um passado mais amplo, preferem batizar suas ruas, avenidas, praças e outros locais públicos com nomes das pessoas ilustres que ali tiveram alguma importância histórica ou atuação relevante. É a melhor forma de reverenciar e, ao mesmo tempo, perpetuar a memória daqueles que se destacaram, e, de alguma forma, contribuíram para o desenvolvimento da comunidade. Por isso, além de merecedores de deferências, é importante que sirvam de exemplo e permaneçam vivos na lembrança das gerações seguintes.
Em Valadares essa prática ainda não alcançou níveis desejáveis. Não porque a cidade seja jovem, ou porque lhe faltem personagens dignos de homenagens. A verdade é que, durante certo tempo, a questão foi negligenciada pelos que por ela deveriam zelar.
Nos seus 80 anos de emancipação, o município exibe um desenvolvimento próprio dos grandes centros, a ponto de ser considerado um polo regional. E essa posição só foi alcançada graças ao trabalho incansável e à dedicação de incontáveis homens e mulheres cujos nomes engrandeceriam quaisquer logradouros.
Há pontos em que a justiça já se faz presente, como na Praça Serra Lima, no Aeroporto Coronel Altino Machado D’ Oliveira, na Avenida Moacyr Paletta, na Escola Municipal Padre Eulálio Lafuente Elorz, na Univale-Campus Armando Vieira, na Eteit-Campus Antônio Rodrigues Coelho, na Vila (Afonso)Bretas, na Praça Euzébio Cabral e no Estádio José Mammoud Abbas, entre outros. Isso sem contar vários edifícios que herdaram nomes dos patriarcas das famílias que os construíram. Mas tem muito mais gente a homenagear.
Em texto recente (Chance de Se Redimir – 21.06.18), falei sobre o extraordinário, mas esquecido, Hermírio Gomes da Silva, falecido há quase 10 anos, e tomei a liberdade de aponta-lo como patrono da Praça de Esportes, existente no centro da cidade; tomara que a ideia repercuta!
A atual administração municipal tem dado inequívoca demonstração de que pretende recuperar o terreno perdido. Ainda há pouco, reverenciou o músico Jacenguay Souza Pettersen, o saudoso Guay, dando seu nome à concha acústica da Praça dos Pioneiros.
Na última terça-feira (17), as atenções se voltaram para a memória de Áurea Franco Machado, uma das mais queridas e ilustres mulheres de sua época. Na ocasião, aconteceu a reinauguração da Praça Treze de Maio, que, revitalizada, passou a se chamar Praça Aurita Franco Machado.  Popularmente conhecido como “Praça da Mulher da Boca Aberta”, o logradouro foi construído nos anos de 1964 e 1965, pelo então prefeito Joaquim Pedro Nascimento. À época, a intenção era homenagear as mulheres valadarenses que, lideradas por Áurea Machado, foram às ruas, aos gritos, protestando contra as ameaças ideológicas que pairavam sobre a nação. Esse grito, aliás, explica a mulher de boca aberta que inspirou o busto erguido no local.
Dona Aurita, como era carinhosamente chamada, se destacou como esposa e mãe, além do seu elevado nível cultural, do dinamismo, da coragem, e do espírito público que sempre pautaram sua maneira de agir. Esteve presente nos grandes momentos da vida comunitária valadarense, coadjuvando ou liderando ações quase impossíveis, mas afinal bem sucedidas. Entre essas, a entronização da imensa imagem de Nossa Senhora que hoje resplandece no Pico da Ibituruna. Sua participação foi também decisiva na criação da Escola Técnica de Enfermagem da Fadivale e na fundação da Sodami.
Para potencializar os seus méritos, Dona Aurita teve a graça e o privilégio de deixar herdeiros valorosos, que, tal como ela, alimentam e demonstram grande amor e dedicação por Valadares. Precisa mais?