segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

TUDO NOS TRINQUES

Por Etelmar Loureiro

              A cidade e a mulher possuem algumas características comuns. Ambas têm seus encantos, seus dilemas e suas crises. Gostam de bom tratamento, de dedicação e carinho, de se sentir belas e sedutoras, de conquistar espaços e de atrair parceiros de qualidade, sobretudo os dispostos a gastar e investir.
Apostam nos filhos, e, gratificadas, ficam orgulhosas das vitórias por eles conquistadas. Fazem projetos auspiciosos e acalentam sonhos de crescimento. Têm um coração pulsante, alimentado pela confiança no futuro.
         O célebre Moraes Moreira, em uma de suas aplaudidas composições, reconheceu que “a mulher e a cidade / representam para mim / amor e liberdade. / A cidade é uma moça / também não tem idade. / É o espírito, a força da mocidade”. 
          Parecidas em muitos aspectos, uma e outra se distanciam no modo de refletir a ação do tempo.
          Despercebido enquanto ela é jovem, o amadurecimento acaba se tornando algoz da mulher. Faz encolher suas energias, inibe-lhe o ânimo, modifica sua beleza externa, antes de tirá-la de cena. Roteiro próprio dos viventes.
            Para a cidade, ao contrário, o passar dos anos costuma ter efeito remoçante e inovador. Abre novos horizontes, induz crescimento, progresso, consagra usos e costumes, ou revela outras vocações. Para o bem ou para o mal, em algum sentido a cidade vai em frente; dificilmente retrocede. 
            Quem há muitos anos acompanha a evolução de Governador Valadares percebe o quanto o aumento da idade lhe tem sido saudável e benéfico. Resultados positivos são inegáveis.
           Desde a emancipação política, em 30/01/1938, sua história registra constantes avanços, de maior ou menor intensidade. Transformou-se no polo econômico regional, com larga influência sobre o leste e o nordeste mineiros, alcançando algumas áreas do Espírito Santo.
Mesmo sem céu de brigadeiro, sempre há teto e coragem para voar.
A cidade vem acumulando importantes conquistas; a Universidade Federal foi uma delas. A inclusão do município na área de atuação da Sudene, se afinal consumada, poderá representar outro grande passo rumo ao desenvolvimento. O Hospital Regional, em fase de construção, contribuirá para consolidar a excelência dos recursos médicos locais. Enquanto isso, o comércio, a construção civil e outros ramos da atividade privada se juntam às ações institucionais, para sustentar bons índices econômicos. E não seria absurdo apostar em dias melhores, assim que se tornarem realidade a modernização do Aeroporto Coronel Altino Machado e a duplicação da BR-381. Isso sem falar na sempre sonhada e muitas vezes prometida extensão de um gasoduto até Valadares.
A localização estratégica, o perfil geográfico, a tranquilidade político-social, a boa estrutura urbana, a estabilidade econômica e a visão empreendedora de suas lideranças são qualidades que explicam esse cenário.
Como toda cidade e toda mulher, Valadares requer manutenção periódica. Um retoque na maquiagem, um “reaperto” no esqueleto, um check-up, uma limpeza de pele, uma tintura de cabelos são imprescindíveis, saudáveis e fazem parte da rotina e da vaidade. 
           A eterna "Princesa do Vale" acaba de chegar aos 80 anos, sem demonstrar necessidade de uma grande recauchutagem. Nada de silicones, lipoaspirações ou bariátrica; “tá tudo nos trinques”! Quando muito, um “peeling”, ou um botox, aqui ou acolá.
            Sob uma administração municipal dedicada e merecedora de confiança, que recriou expectativas em torno de um futuro mais promissor, a cidade vive momentos de indisfarçável otimismo. 
        Bonita e cativante, apenas lhe faltam mais pretendentes de visão, que tenham dote, disposição e seriedade para investir no seu potencial.
Dispensados, com certeza, os príncipes encantados que proporcionam uma maravilhosa noite de Cinderela, seguida de frustrante vida de Gata Borralheira. De “malas”, oportunistas e enganadores, Valadares já se cansou.

- Diário do Rio Doce - 01.02.2018
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CULPAS DIVIDIDAS

Por Etelmar Loureiro
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            Certos temas são maçantes, desagradáveis, indesejáveis, mas inevitáveis. Recorrentes por natureza, estão sempre na ordem do dia, “esquentando” todos os noticiários. É o caso dos acidentes de trânsito.
Em maior ou menor dimensão, eles acontecem diariamente. Entretanto, é nas épocas festivas, presumidamente mais alegres, que as tragédias se multiplicam, desmanchando prazeres e enlutando famílias e comunidades. A explicação estaria no fato de serem períodos que envolvem muitas mobilizações e longas caminhadas, em busca de entretenimento e confraternizações.
            Durante a recente temporada de Natal e réveillon, aconteceram nas estradas federais perto de 2,4 mil acidentes, com cerca de 440 mortos e mais de 2.300 feridos. O balanço apresentado pela Polícia Rodoviária Federal mostra que as ocorrências diminuíram, em comparação com o ano anterior. Ainda assim, são números assombrosos e inaceitáveis, superiores aos contabilizados em muitos casos de epidemias, tragédias ambientais e conflitos armados. Não merecem celebração.
            Dividindo espaço com aqueles festejos, existem as férias, que neste ano se prolongarão até pelo menos meados de fevereiro, após o término do Carnaval.
            A corrida à procura de repouso e prazer aumenta a circulação nas estradas e eleva a reunião de pessoas nas praias, nas estâncias hidrominerais e em outros pontos turísticos. É quando o bicho costuma pegar, pra valer.
          O fluxo de veículos cresce consideravelmente, e as pistas são tomadas por motoristas que dirigem muito bem nas ruas e avenidas urbanas, mas são inexperientes nas rodovias. As consequências costumam ser diabólicas.
Some-se a isso o maior consumo de bebidas alcoólicas e outras drogas, além de imprudências ao volante, ingredientes perfeitos para finais melancólicos.
As autoridades procuram ser criteriosas na análise desse cenário, apontando com precisão as causas das tragédias. Chegam a discriminar o percentual de cada uma. De modo geral, elas se dividem entre ultrapassagens irregulares (campeãs absolutas), excesso de velocidade e direção após o consumo de álcool.
Não se vê, entretanto, qualquer estatística oficial dando conta do percentual de acidentes causados pelas estradas obsoletas, esburacadas, mal sinalizadas, sem adequada fiscalização e congestionadas por uma frota de veículos que cresce descontroladamente, afora outras deficiências que cabe ao poder público sanar. Na quase totalidade dos desastres, a culpa recai sobre um determinado motorista, acusado de excesso de velocidade, ultrapassagem em local proibido, embriaguez ao volante e outras loucuras.
Sem intenção de defender os infratores motorizados, é tempo de compartilhar responsabilidades. Não é possível que as autoridades responsáveis pela boa qualidade das estradas, independentemente dos cargos que ocupem, permaneçam isentas das punições aplicáveis aos cidadãos comuns, quando elas não fazem a sua parte. Em tais circunstâncias, tanto quanto os demais infratores das leis, esses agentes públicos são criminosos que merecem ser duramente punidos, por omissão, negligência, indiferença e desrespeito à vida.
A estação do lazer está em curso. O Carnaval bate às portas. Viagens de ida e vinda estarão ocorrendo a todo o momento, chova ou faça sol. 
           Tudo faz crer que o “salve-se quem puder” continuará sendo a lei maior.
 Fatalidades são incontroláveis, mas há formas de tentar evitá-las, ou de,  quando nada, minimizar suas consequências. Uma delas é conscientizar-se de que o risco existe, e não é pequeno. Fuja dele; o ganho será seu!

- Diário do Rio Doce - 18.01.2018