sábado, 5 de fevereiro de 2011

O JEITO DELA (06.02.2011)


Passado o primeiro mês de governo, a presidente continua evitando falar e aparecer além do necessário. Prefere comunicar através Antonio Palocci (Casa Civil), Gilberto Carvalho (Secretaria Geral) e Miriam Belchior (Planejamento), seus ministros e porta-vozes mais chegados.
Quando necessário, não se furta a dar as caras, como acabou de fazê-lo na abertura dos trabalhos do Congresso Nacional. Compromisso, aliás, não raro evitado por seus antecessores.
            Na verdade, o que parecia ser um recato passageiro, próprio de iniciante no cargo, começa a ser visto como traço da personalidade de Dilma Rousseff.  Marca registrada com a qual é melhor se acostumar.
Para decepção e tristeza dos que curtem o clima de oba-oba, ela se revela cada vez mais discreta e avessa ao exibicionismo. Demonstra sentir-se bem na a privacidade do Palácio do Planalto, longe dos holofotes, onde tem mais condições de refletir e decidir com segurança. É o jeito dela, que lhe vem rendendo crescente respeito e admiração popular.
            O sociólogo Marcos Coimbra, presidente do Instituto Vox Populi, avalia que “o balanço deste começo de governo Dilma é claramente positivo. Ela confirma o que se esperava que fizesse de bom e surpreende de maneira sempre favorável. Até seus desafetos ficam com dificuldade de criticá-la”.
            Trocando em miúdos, a sucessora de Lula está surfando nas ondas do sucesso. Vive intensa lua de mel com a opinião pública. Tudo ancorado em uma receita caseira, onde simplicidade, transparência, determinação e autoridade se misturam para gerar aceitação e credibilidade.
Some-se o apelo popular embutido nas suas juras de campanha sempre renovadas, inclusive nas palavras que proferiu na abertura do ano legislativo.
            O discurso de Dilma foi analisado por Aécio Neves como sendo “um belo conjunto de boas intenções, não muito diferente do que o presidente Lula fez há oito anos. Ouvi com respeito, mas vou guardar meus aplausos para quando essas promessas se transformarem em ações”.
Opositor comedido, o senador mineiro foi habilidoso no criticar Dilma pelo que Lula prometeu e não cumpriu.
Aplausos e apupos fazem parte do script. Não devem ser reprimidos; são próprios da democracia.
Mas é bom lembrar que promessas não alimentam; chegará o momento da cobrança de resultados.
            Como a lua de mel, a paciência do povo é efêmera. 

EFEITO RENOVADOR (30.01.2011)



            A cidade e a mulher possuem algumas características comuns. Ambas gostam de bom tratamento, de dedicação e carinho, de se sentir bela e atraente, de conquistar espaços e de atrair parceiros de qualidade, sobretudo os dispostos a investir. Apostam nos filhos e sentem orgulho das vitórias por eles conquistadas. Fazem projetos e acalentam sonhos de crescimento. Têm um coração pulsante, alimentado pela confiança no futuro.
            O grande Moraes Moreira, em uma de suas festejadas composições, reconheceu que “a mulher e a cidade / representam para mim / amor e liberdade. / A cidade é uma moça / também não tem idade. / É o espírito, a força da mocidade”.
            Parecidas em muitos aspectos, elas se distanciam no modo de sentir os efeitos do tempo.
            Despercebido enquanto ela é jovem, o passar dos anos acaba se tornando algoz da mulher. Faz retrair suas energias, inibe o ânimo, modifica-lhe a beleza externa, antes de tirá-la de cena.
            Já para a cidade, o adiantar do calendário tem efeito renovador. Abre horizontes, induz crescimento, progresso, consagra usos e costumes ou revela novas vocações. Para o bem ou para o mal, em algum sentido a cidade vai em frente; dificilmente recua.
            Quem conhece Valadares, há muitos anos, percebe o quanto o aumento da idade lhe tem sido benéfico.
            Desde a emancipação política (30/01/1938), sua história contempla avanços de maior ou menor intensidade, mas sempre presentes. Transformou-se no pólo econômico regional, com larga influência sobre o leste e o nordeste mineiros, mais algumas áreas do Espírito Santo.
            A localização estratégica, o perfil geográfico, a tranqüilidade político-social, a boa estrutura urbana, a estabilidade econômica e a visão empreendedora de suas lideranças contribuíram para isso.
            Como toda cidade e toda mulher, necessita de manutenção periódica. Um retoque na maquiagem, um “reaperto” no esqueleto, um check-up, uma limpeza de pele, uma tintura de cabelos são saudáveis e fazem parte da rotina.
            Mas, Valadares chega hoje aos 73 anos, sem demonstrar necessidade de uma grande recauchutagem. Nada de silicones, lipoaspirações ou redução de estômago; “ta tudo em cima”!
            Bonita e cativante, faltam-lhe apenas pretendentes de visão, que tenham dote, disposição e seriedade para investir no seu potencial. Dispensados os príncipes encantados que proporcionam a maravilhosa noite de Cinderela, seguida de uma vida de Gata Borralheira. Assim não dá!

SILÊNCIO PREOCUPANTE (23.01.2011)

           
            Acostumado com o ritmo frenético do governo Lula, em que havia sempre um fato novo capaz de surpreender ou decepcionar, a opinião pública mostra-se preocupada com a forma bem comportada da administração Dilma.
            A calmaria é tanta que, não fossem as notícias da tragédia provocada pelas chuvas no estado do Rio de Janeiro, os meios de comunicação estariam em recesso. Ou teriam ampliado a duração das novelas, dos reality shows e das demais atrações de sua grade de programação.
            Em termos políticos, o foco tem sido a famigerada e constrangedora disputa de cargos entre partidos. No campo econômico-financeiro, o destaque ficou por conta do já esperado reajuste da taxa Selic, decidido pelo Comitê de Política Financeira, no correr da última semana. De resto, só perfumaria incapaz de gerar notícias empolgantes.
            Para agravar, a presidente tem falado e aparecido muito pouco. A rigor, depois de sua posse, só marcou presença quando foi conferir, no local, os estragos acontecidos na região serrana fluminense. Seus ministros e porta-vozes é que têm repassado à população algumas informações sobre as idéias que alimenta.
            Enquanto isso, Dilma estaria empenhada em fazer deslanchar o plano dos primeiros 100 dias de governo - dos quais vinte e três já se passaram – e em eleger ações mais importantes e abrangentes.
Tudo bem que não faça alarde ou mantenha sob reserva seus projetos estratégicos ou eventuais mudanças profundas que pretenda executar. São deliberações que de fato precisam amadurecer, antes de serem divulgadas.
Mas há ocasiões em que Dilma não poderia abdicar de atitudes próprias, nem temer a exposição de sua imagem, sob pena de decepcionar. Parece que ela não percebeu, nem foi alertada quanto a isso.
Já na escolha de seu primeiro escalão, sustentou em seu ministério Pedro Novais (PMDB/MA) e Ideli Salvatti (PT/SC), apesar das notícias de que teriam praticado malversação recursos públicos.
Mantém indefinido o caso dos passaportes diplomáticos indevidamente concedidos aos filhos e neto de Lula e a um bispo da Igreja Universal. O que também acontece com a decisão de não extraditar o italiano Cesare Battist. Duas bombas deixadas pelo governo anterior, para explodirem no atual.
Segundo o noticiário, está agora na contingência de explicar o desvio de meio bilhão de reais acontecido na Funasa – outra herança da administração Lula. A denúncia partiu da Controladoria Geral da União (CGU), órgão vinculado à Presidência da República.
A verdade é que o silêncio de Dilma começa a provocar uma incômoda sensação de vazio de poder. A esperança é de que ele signifique apenas um novo estilo de governar. Embora possa ser também entendido como incapacidade para agir na forma e na hora certas.
Por enquanto, qualquer julgamento seria precipitado. A presidente dispõe de tempo para mostrar a que veio. Mas precisa ficar atenta às situações em que seu silêncio dará margem a equivocadas interpretações. Entre elas a controvertida presunção de que quem cala consente.

REPRISES INDESEJÁVEIS (16.01.2011)


            Há praticamente um ano, o Brasil acordava com o estrondo de enorme deslizamento de terras no litoral sul fluminense, causador de dezenas de mortes em Angra dos Reis e Ilha Grande.
             A catástrofe aconteceu na noite de réveillon, interrompendo sonhos dos que ali se encontravam para uma festiva passagem de ano. Em lugar de comemorações, os sobreviventes se viram na contingência de acumular forças para tentar reconhecer e sepultar amigos e familiares.
            Passados apenas quatro meses, sobreveio novo grave acidente, também no estado do Rio. Em Niterói, inúmeras casas construídas no Morro do Bumba foram soterradas, formando outro contingente de vítimas fatais. O local era apenas um antigo aterro sanitário desativado. Aos poucos foi ocupado por pessoas que ali edificavam suas casas, talvez ignorando o perigo a que se expunham. Uma tragédia anunciada.
            Em ambos os casos pagou-se preço muito elevado pela ocupação de áreas de risco, sujeitas a fatalidades.
            Esses desastres continuam se repetindo, quase sempre nas mesmas regiões, com semelhança e regularidade impressionantes. A cada ano vê-se um cenário mais desolador, sugerindo que “pior do que este, só o próximo”.  A recorrência já se faz tão previsível quanto o Natal, o carnaval ou a reedição do Big Brother Brasil.
            Nem assim as autoridades têm encontrado motivação para planejar e implementar ações preventivas capazes de, quando nada, minimizar as conseqüências desses fenômenos. Omissão até certo ponto compreensível, pois tais iniciativas não costumam render votos.
            O Brasil não é a única vítima de enchentes, desmoronamentos, inundações, queimadas, secas e outras calamidades. Elas acontecem em qualquer lugar, castigando pobres e ricos, em pequenos e grandes centros. A diferença fica por conta da quantidade de vítimas e da intensidade da destruição. Sofrem menos as nações mais desenvolvidas, onde os recursos públicos são corretamente aplicados em planejamento, prevenção e educação do povo. Estágio ainda não alcançado por nosso país.
            As centenas de mortes e os prejuízos resultantes dos temporais que recentemente se abateram sobre São Paulo e a região serrana fluminense são alarmantes, irreparáveis e inaceitáveis. Mas dão aos governantes outra chance de meditar sobre suas responsabilidades e o que precisam fazer para evitar o “vale a pena ver de novo”. Com a certeza de que investir em prevenção é melhor e mais gratificante que gastar na reconstrução de áreas destruídas e na busca de corpos soterrados.