quinta-feira, 9 de novembro de 2017

OS CONFLITOS DA REFORMA PREVIDENCIÁRIA

Por Etelmar Loureiro

Passadas as duas tormentas que ameaçavam sua continuidade, e mesmo consciente de que outras poderão surgir, o governo volta a investir na reforma da Previdência, a menina dos olhos do presidente Michel Temer e do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Nela têm sido concentrados todos os esforços oficiais, mas não está fácil vender o peixe.
            Como se não bastasse a resistência da opinião pública, o relatório final do senador Hélio José (Pros-DF) sobre os trabalhos da CPI da Previdência, unanimemente aprovado no último dia 25, foi uma verdadeira ducha de água fria no otimismo do governo.
O documento aponta erros na proposta do Executivo; propõe emendas à Constituição e projetos de lei; além de apontar um elenco de medidas a serem adotadas para o equilíbrio do sistema previdenciário brasileiro. Entre essas, o uso de mecanismos de combate às fraudes, maior rigor na cobrança dos grandes devedores e o fim do desvio de recursos para outros setores.
Assinala, ainda, inconsistência de dados oferecidos pelo governo, que "desenham um futuro aterrorizante e totalmente inverossímil”, com o objetivo de extinguir a Previdência pública, abrindo espaço para atuação das empresas privadas. Ainda segundo as conclusões da CPI, essas empresas devem à Previdência R$ 450 bilhões, dos quais apenas R$ 175 bilhões correspondem a débitos recuperáveis.
A discordância entre governo e a CPI chegou a ponto de Hélio José  querer incluir, em seu relatório, sugestão de indiciamento dos ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Eliseu Padilha (Casa Civil), por terem fornecido dados inconfiáveis, “mentirosos e falaciosos”, com o intuito de defender a necessidade da reforma da Previdência. Seus companheiros de trabalho conseguiram demovê-lo dessa ideia.
            Para o senador Telmário Mota (PTB-RR), membro da Comissão, “esta Casa levantou dados importantes, colhidos junto ao próprio governo, com meses de estudos e análises. A CPI mostrou que há fraude e há corrupção, e que a Previdência não é deficitária”. Por sugestão dele, uma cópia do relatório será entregue diretamente a Michel Temer. Outras vias serão destinadas a diversos órgãos da administração federal, para análise e providências cabíveis.
Pelo relatório final, que tem 253 páginas, a CPI, nos seus seis meses de funcionamento, apresentou a órgãos públicos dezenas de requerimentos de informações, promoveu 31 audiências públicas e ouviu mais de 140 pessoas, entre representantes de órgãos governamentais, sindicatos, associações, empresas, além de membros do Ministério Público e da Justiça do Trabalho, deputados, auditores, especialistas, professores e outros.
            O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, não hesitou em contestar esse exaustivo e dispendioso trabalho. Segundo ele, "a CPI emitiu uma opinião que não existe déficit. Mas ela não comprovou. Os números foram calculados de forma errada”. Disse, ainda, não ser “momento para demagogia, para enganos”.
Outras opiniões contrárias também foram emitidas por especialistas no assunto. Entre esses o procurador do Ministério Público junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, aquele que apontou as “pedaladas” responsáveis pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Em extenso artigo publicado no site Consultor Jurídico, ele argumenta que a CPI da Previdência vende uma ilusão, ao afirmar que não há déficit. Não lhe faltaram fundamentadas contestações.
              Por sua vez, o trabalhador continua achando que a indigitada reforma previdenciária será mais um sacrifício exigido do povo. Sempre a pretexto de sanear as finanças de um país que cada vez mais se afunda em dívidas provocadas pela má gestão, pela incompetência, pela ganância e pela safadeza de seus homens públicos.

            É nesse clima polêmico que a matéria deverá ser submetida ao plenário da Câmara. Resta a pálida esperança de que, na ocasião, os parlamentares atuem com bom senso e independência, sem trocar o apreço pela dignidade pelo preço do voto.