Por Etelmar Loureiro
Passadas as duas
tormentas que ameaçavam sua continuidade, e mesmo consciente de que outras
poderão surgir, o governo volta a investir na reforma da Previdência, a menina
dos olhos do presidente Michel Temer e do ministro da Fazenda, Henrique
Meirelles. Nela têm sido
concentrados todos os esforços oficiais, mas não está fácil vender o peixe.
Como se não bastasse a resistência
da opinião pública, o relatório final do senador Hélio José (Pros-DF) sobre os
trabalhos da CPI da Previdência, unanimemente aprovado no último dia 25, foi uma
verdadeira ducha de água fria no otimismo do governo.
O documento aponta erros na proposta do Executivo; propõe
emendas à Constituição e projetos de lei; além de apontar um elenco de medidas
a serem adotadas para o equilíbrio do sistema previdenciário brasileiro. Entre
essas, o uso de mecanismos de combate às fraudes, maior rigor na cobrança dos
grandes devedores e o fim do desvio de recursos para outros setores.
Assinala, ainda, inconsistência de dados oferecidos pelo
governo, que "desenham um futuro aterrorizante e totalmente inverossímil”,
com o objetivo de extinguir a Previdência pública, abrindo espaço para atuação
das empresas privadas. Ainda segundo as conclusões da CPI, essas empresas devem
à Previdência R$ 450 bilhões, dos quais apenas R$ 175 bilhões correspondem a
débitos recuperáveis.
A discordância entre governo e a CPI chegou a ponto de Hélio
José querer incluir, em seu relatório, sugestão
de indiciamento dos ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Eliseu Padilha
(Casa Civil), por terem fornecido dados inconfiáveis, “mentirosos e
falaciosos”, com o intuito de defender a necessidade da reforma da Previdência.
Seus companheiros de trabalho conseguiram demovê-lo dessa ideia.
Para o senador Telmário Mota
(PTB-RR), membro da Comissão, “esta Casa levantou dados importantes, colhidos
junto ao próprio governo, com meses de estudos e análises. A CPI mostrou que há
fraude e há corrupção, e que a Previdência não é deficitária”. Por sugestão dele,
uma cópia do relatório será entregue diretamente a Michel Temer. Outras vias
serão destinadas a diversos órgãos da administração federal, para análise e
providências cabíveis.
Pelo relatório final, que tem 253 páginas, a CPI, nos seus
seis meses de funcionamento, apresentou a órgãos públicos dezenas de
requerimentos de informações, promoveu 31 audiências públicas e ouviu mais de
140 pessoas, entre representantes de órgãos governamentais,
sindicatos, associações, empresas, além de membros do Ministério Público e da
Justiça do Trabalho, deputados, auditores, especialistas, professores e outros.
O ministro da Fazenda, Henrique
Meirelles, não hesitou em contestar esse exaustivo e dispendioso trabalho.
Segundo ele, "a CPI emitiu uma opinião que não existe déficit. Mas ela não
comprovou. Os números foram calculados de forma errada”. Disse, ainda, não ser
“momento para demagogia, para enganos”.
Outras opiniões contrárias também foram emitidas por
especialistas no assunto. Entre esses o procurador do Ministério Público junto
ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, aquele que apontou as “pedaladas” responsáveis
pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Em extenso artigo publicado
no site Consultor Jurídico, ele argumenta que a CPI da Previdência vende uma
ilusão, ao afirmar que não há déficit. Não lhe faltaram fundamentadas
contestações.
Por sua vez, o
trabalhador continua achando que a indigitada reforma previdenciária será mais
um sacrifício exigido do povo. Sempre a pretexto de sanear as finanças de um
país que cada vez mais se afunda em dívidas provocadas pela má gestão, pela
incompetência, pela ganância e pela safadeza de seus homens públicos.
É nesse clima polêmico que a matéria deverá ser submetida
ao plenário da Câmara. Resta a pálida esperança de que, na ocasião, os
parlamentares atuem com bom senso e independência, sem trocar o apreço pela dignidade
pelo preço do voto.