quinta-feira, 21 de novembro de 2019

CONSCIÊNCIA DISTORCIDA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 21.11.2019

          Na definição da Wikpedia, “consciência é uma qualidade psíquica, isto é, que pertence à esfera da psique humana, por isso diz-se também que ela é um atributo do espírito, da mente, ou do pensamento humano”.
         Sob esse conceito, a consciência se nivela ao amor, o ódio, a alegria, a tristeza, o tesão, a frigidez, a dor, o prazer, a admiração, a aversão, a fé, a desilusão e tantos outros sentimentos que não têm cor, têm intensidade.
           Difícil, pois, atribuir matiz à consciência que se ocupa dos afrodescendentes.
         Tudo bem que sejam homenageados os que aqui chegaram e trabalharam para consolidar a nação brasileira. Heróis e vilões indígenas, portugueses, africanos, espanhóis, franceses e de outras origens que contribuíram para as conquistas hoje festejadas. Não há uma bandeira predominante. Maximizar ou minimizar a participação de quem quer que seja seria negar a teoria que valoriza o esforço conjunto.
          Distingui-los pelo físico, pela inteligência, pela religião, pela cor ou por qualquer outra característica própria é incorrer em imperdoável discriminação. Uma visão distorcida, injusta e contrária à tese de igualdade humana.
          O diplomata Paulo Roberto de Almeida, Ph.D. em Ciências Sociais, em seu blog “Diplomatizzando”, disse achar “curiosa essa insistência na "consciência" negra, na "dignidade" negra, em qualquer coisa "negra", ou afrodescendente e seus equivalentes funcionais, com toda a carga de racismo implícito embutido nos programas oficiais do governo”. Entre outros questionamentos sobre o que se pretende, ele indaga se não seria essa a forma de “criar uma nação, uma cultura, uma sociedade apartada das correntes nacionais miscigenadoras e "misturadoras" de todos os brasileiros”.
          Sob o rótulo de Dia Nacional da Consciência Negra, o 20 de novembro, ontem celebrado, é reservado à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira. A data foi escolhida por coincidir com a morte de Zumbi dos Palmares, em 1695. 
Nada contra a que se reverencie a comunidade negra e o grande herói brasileiro que, por vários anos, comandou um movimento de resistência à escravidão.
          O que muitos questionam é a indisfarçável conotação racista desse tributo.
          Na essência, brancos, negros e mulatos, formamos um único povo, uma mesma nação. Seres humanos se distinguem por seu caráter e dignidade, não pela cor.
          Se a intenção for homenagear uma raça, melhor que isso se faça com isenção e através de ações voltadas para a educação, saúde, segurança, moradia, inserção no mercado de trabalho e outras medidas que proporcionem o bem-estar social de seus integrantes. Afora isso, as iniciativas podem resultar inócuas, não passando de maquiagem incapaz de ocultar enorme falta de consciência.

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

TRÊS DÉCADAS SEM O MURO DA VERGONHA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 07.11.2019

Desde a última segunda-feira, a capital da Alemanha está em festa. Pelas expectativas, mais de um milhão de convidados se unirão aos cerca de quatro milhões de berlinenses, para, no próximo sábado, 09/11, festejar os 30 anos da queda do Muro de Berlim. O desmoronar do símbolo da Guerra Fria, uma abominável e irracional barreira de concreto, com mais de 100 quilômetros de extensão, que entre 1961 e 1989 dividiu Berlim em duas partes.
 Seu objetivo era deter o elevado fluxo de gente que emigrava para a parte ocidental de Berlim, onde uma forte retomada econômica pós-guerra oferecia melhores chances de trabalho e negócios.
 Mas o muro era um trambolho arquitetônico, símbolo da insensibilidade comunista. Verdadeira catástrofe ideológica causada pela Guerra Fria em que os Estados Unidos e a União Soviética disputavam a hegemonia mundial.
 Começou a ser erguido na madrugada de 13 de agosto de 1961, logo provocando a separação de famílias, amigos e de toda uma nação por quase três décadas.
 Nos 28 anos em que se manteve de pé, causou sofrimentos e tragédias que jamais se apagarão da memória coletiva.
Entre os sensatos, ninguém supunha que aquele paredão fosse durar eternamente. Faltava-lhe sustentação ideológica, justificativa relevante, algo que lhe conferisse o status de imprescindível e digno de se alojar na lembrança positiva da humanidade. Por outro lado, nem os mais otimistas imaginavam que o monstrengo seria derrubado antes de 50 ou 100 anos.
  Sua queda, em 9 de novembro de 1989, marcou o fim de um longo período de hostilidades e de disputas econômicas, filosóficas e militares, entre capitalistas e marxistas.
            Na verdade, o também chamado “muro da vergonha” não caiu da noite para o dia. Segundo Margaret Tutwiler, à época porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, isso só aconteceu graças a um “processo longo e complexo”, de diversas negociações diplomáticas.
            A história também registra que um dos fatores que muito contribuíram para o acontecimento foi um pronunciamento de Ronald Reagan no dia 12 de junho de 1987. Naquela ocasião, o então presidente dos EEUU se dirigiu a Mikhail Gorbachev, o último líder da URSS, e disse: “senhor Gorbachev, derrube esse muro”.
                E assim se passaram três décadas de um fato que, pelas suas características, e, sobretudo, pela forma pacífica e tranquila como aconteceu, assombrou o mundo. Sem qualquer dúvida, constitui um dos acontecimentos mais extraordinários da história, indutor de grandes mudanças no cenário mundial.
            Entretanto, embora exemplar e auspicioso, esse episódio não significou o fim das demais barreiras existentes, nem desestimulou a construção de outras tantas. Pelo contrário, a prática tornou-se recorrente, típica do egocentrismo em que vivemos.
           Nos quatro cantos do mundo os muros são mantidos ou proliferam, aos montões, aprofundando o abismo entre negros e brancos, ricos e pobres, cultos e ignorantes, héteros e homossexuais, democratas e socialistas, liberais e conservadores, cristãos e islâmicos, e outras polarizações.
Velhos conhecidos, eles sempre existiram, separando pessoas e contribuindo para a legitimação de poderes presumidos. O passar do tempo apenas fez com que se tornassem cada vez mais sólidos, densos, espaçosos e intransponíveis.
Os mais difíceis de derrubar nem sempre são físicos e visíveis. Piores são os imateriais, de natureza política, econômica, social, étnica, moral, intelectual, religiosa e outras ditadas por paradigmas e regras subjetivas.
Assim como o Muro de Berlim, uns e outros devem ser exterminados, a bem da humanidade.           
            Em condições normais, a função precípua dos muros é proteger imóveis. Afora isso, eles só servem para refúgio de políticos indecisos, ou para o “pulo de obstáculo” no qual se exercitam alguns casados. Adeptos que não raro se complicam.

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

A LONDRES BRASILEIRA


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 24.10.2019

Viajar não é o meu fraco, não se inclui entre os hábitos pelos quais morro de amores. Dizer que não gosto seria exagero. Apenas não sinto pela viagem, sobretudo na sua fase preparatória, aquela ansiedade e aquele êxtase que tomam conta dos aficionados por fazer as malas e sair em busca de outras paragens. Ao contrário, sou tomado pelo desânimo e pela vontade de ficar quietinho onde estou. Ainda não cheguei ao exagero de procurar um analista que possa me apontar os motivos desse comportamento e, quem sabe, me modificar. Quando muito, faço uma autoanálise e me detenho em algumas possíveis explicações para esse “my way”. Uma delas seria a herança paterna: meu saudoso pai, viajante contumaz quando jovem, com o passar dos anos incorporou-se ao time dos “daqui não saio, daqui ninguém me tira”; e só Deus o tirou.
Outra hipótese seria o comodismo, turbinado pelo apego aos valores materiais, ambientais e pessoais, dos quais não gosto de me separar.
A maior culpa, entretanto, sempre recai nas mais de uma centena de cansativas viagens feitas entre Brasília e Governador Valadares, nos 33 anos que morei na capital federal. Um trecho de quase 1.100 quilômetros, que frequentemente percorri com mulher, filhos e volumosas bagagens, ao volante daqueles “carrões” que Fernando Collor comparava a carroças, desprovidos de direção hidráulica, de ar condicionado e até de cintos de segurança. Decididamente, não foi uma experiência das mais prazerosas.
            Mas o fato de não ser um entusiasta não significa que eu seja resistente ou intolerante a viagens. Faço tanto as obrigatórias como as de lazer, sempre que necessárias ou oportunas. Sozinho ou acompanhado de familiares e amigos, já estive em várias partes do país e do exterior. E, por paradoxal que seja, gosto de ter viajado.  Agora, por exemplo, sinto-me muito bem em Londrina, uma magnífica metrópole paranaense, a segunda cidade mais importante do Estado. Aqui, eu e minha Marlene visitamos a nossa filha Débora, o genro Rodrigo Lourenço, as netas Ana Carolina e Anna Júlia e o neto Victor, que se incluem entre os quase 600 mil habitantes locais.
                Fundada em dezembro de 1934, a cidade levou menos de quatro décadas para atingir um alto nível de crescimento populacional e econômico. Nesse período, dedicou-se ao cultivo e comercialização do café, o que lhe valeu o título de Capital Mundial do Café. Após 1970, o panorama econômico londrinense foi gradual e positivamente se modificando, a ponto de a área se tornar um dos mais importantes e diversificados centros industriais, econômicos, financeiros, administrativos e culturais do interior do país. É uma cidade jovem, moderna e pulsante, que se distingue por sua excelência na prestação de serviços, no comércio e no turismo.
A história, de empolgantes capítulos, é longa para ser contada em tão curto espaço. Impossível, entretanto, omitir uma interessante curiosidade sobre a cidade. Seu nome foi ideia do inglês Simon Joseph Fraser e de seus companheiros que, em 1925, fundaram a Companhia de Terras do Norte do Paraná, pioneira na colonização regional. Percebendo semelhança entre a névoa característica da mata local e a neblina própria de Londres, eles decidiram homenagear a capital inglesa, batizando o lugar com o nome de Londrina, que significa “pequena Londres”.
Sempre que visito outras localidades, tento conhecer ao máximo as suas características, a fim de fazer comparações com Governador Valadares.
Desta vez, as conclusões são amplamente favoráveis a Londrina. Embora seja apenas quatro anos mais velha, a cidade paranaense está anos-luz à nossa frente. Seu desenvolvimento socioeconômico e cultural supera todas as expectativas. Claro que para isso influiu o tipo de colonização, as condições climáticas, a estratégica localização e inúmeros outros fatores positivos.
Mas Valadares não tem motivos para se sentir inferiorizada. Afinal, em termos de progresso comunitário, o importante é o povo e seus administradores manterem tranquila consciência de que estão honesta e verdadeiramente empenhados na sua busca. Afora isso, é persistir e ter paciência.
Em meio a todos os descompassos, Londrina e Valadares têm duas qualidades em comum: a hospitalidade e o calor – tanto o climático quanto humano. Não deixa de ser uma gratificante afinidade.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

UMA ABERTURA DE FECHAR O TEMPO


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 26.09.2019

            As atenções mundiais estão novamente voltadas para a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), que se instalou na última terça feira, 24, na sede da ONU, em Nova York.
            A primeira sessão da AGNU aconteceu em Londres, aos 10 de janeiro de 1946, no Westminster Central Hall. A segunda foi em Nova York e a terceira em Paris. A fixação na sede das Nações Unidas deu-se em 14 de outubro de 1952.
            Quando de sua instalação, a Assembleia contava com 51 membros. Hoje são 193, cada qual com direito a um voto.
            Historicamente, o discurso de abertura do evento é feito pelo representante do Brasil, tradição que vem sendo mantida desde a sessão da cúpula em 1955. A deferência não decorre de qualquer dispositivo estatutário da ONU. Estaria relacionada com o fato de o Brasil ter sido o primeiro país a aderir à Organização, sendo, pois, um de seus fundadores. Ademais, o brasileiro Osvaldo Aranha, então ministro de Relações Exteriores do governo Getúlio Vargas, se destacou na história da entidade, tendo presidido a primeira sessão especial e a segunda sessão ordinária da mesma, nas quais foi aprovada a criação do Estado de Israel, com apoio do Brasil.    
Este ano não foi diferente. Coube a Jair Bolsonaro a honrosa tarefa. E o nosso presidente não “fugiu do pau”. Mesmo ainda convalescendo de uma cirurgia, lá foi ele dar o seu recado. E o fez bem ao seu estilo.  
            Com um discurso objetivo, contundente e desafiador, por muitos considerado agressivo, Bolsonaro abriu a 74ª Assembleia Geral da ONU criticando os governos da França, Venezuela e Cuba, o socialismo e o ambientalismo. Apontou ações que considera ameaças à soberania do Brasil.
Ao falar da Amazônia, ele rotulou como "falácia" a ideia de que a floresta é um patrimônio da humanidade. Não chegou a mencionar a França diretamente, mas se referiu à nação presidida por Emmanuel Macron como “um país” que seguiu a “mídia sensacionalista” e ousou “sugerir a aplicação de sanções contra o Brasil” no episódio dos incêndios na Amazônia. Macron disse que estava “na correria” e não ouviu o discurso de Jair Bolsonaro.
            O próprio Bolsonaro usou o Twitter para avaliar sua estreia na reunião: “Na ONU, levei a palavra firme do Brasil, dando voz aos verdadeiros anseios e valores de nosso amado povo. Estamos construindo um país mais próspero, onde a liberdade, a inviolabilidade da nossa soberania e a vontade dos brasileiros são os três alicerces que nos darão sustentação”, disse ele.
            No campo político, não existe meio-termo, nem meia verdade; cada um fala aquilo que politicamente lhe convém.
            Dentro do esperado, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffman, disse que “o discurso de Bolsonaro foi vazio como ele. Não trouxe nada de concreto e se resumiu a uma guerra ideológica contra governos, ONG’s, militantes e a imprensa. Um completo vexame”.
Já o ministro Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, achou que "o presidente Jair Bolsonaro fez discurso altivo, corajoso, verdadeiro e soberano, reafirmou seu compromisso com valores e princípios, tais como a liberdade, democracia, família e liberdade religiosa. Honrou a tradição brasileira na ONU".
Apontado por Bolsonaro como um “símbolo” do país, o ministro da Justiça, Sergio Moro, emitiu a opinião que até agora me parece a mais racional: “Discurso assertivo na ONU. Pontos essenciais: soberania, liberdade, democracia, abertura econômica, preservação da Amazônia, oportunidades e desenvolvimento para a população brasileira”.
Uma coisa é certa: marcada por palavras cordiais, às vezes enfadonhas e meramente protocolares, a abertura da Assembleia Geral da ONU dificilmente será a mesma, depois do pronunciamento de Bolsonaro. Quem sobreviver verá!

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

REEDITANDO O QUE DEU CERTO


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 12.09.2019

Nos anos 1950/1970, inúmeras famílias de Governador Valadares assistiram a uma verdadeira debandada de seus filhos. Premidos pela necessidade de continuar seus estudos, eles tiveram que fazer as malas e rumar para centros mais desenvolvidos, onde isso lhes fosse possível. Então, muitos se mandaram para Belo Horizonte, Vitória, Rio, São Paulo e outras grandes cidades, inclusive do exterior. Por lá se formaram, se estabeleceram, constituíram família e acabaram criando raízes. Em qualquer parte do planeta terra é possível encontrar valadarenses bem-sucedidos, atuando nos mais diversos setores.
            Muitos desses “retirantes”, hoje setentões, embora espalhados pelo mundo, conseguem preservar um bom relacionamento entre si, como se nunca houvessem se afastado uns dos outros.
            A explicação para tão profícuo entrosamento não se resume aos vínculos de amizade que uniram essas pessoas na meninice e na mocidade, quando eram vizinhos ou formavam uma só tribo. Há outra expressiva conexão, que inclusive concorre para que a turma se torne cada vez mais numerosa: o Colégio Ibituruna, onde, na década de 1960, todos cursaram o primeiro e segundo graus.
´           É extraordinária a influência dessa escola sobre o emocional de seus ex-alunos. Mesmo após um longo distanciamento, os professores, os colegas, as salas de aula, os desafios, as brincadeiras, as rusgas e emoções sobrevivem na lembrança de todos, alimentando um espírito de união que se fortalece com o passar dos anos.
            Entre os diferentes meios de sustentar esse estreito convívio, eles formaram no WhatsApp um numeroso grupo, onde interagem de forma contínua, falando de família, política, esporte, humor, amenidades, sacanagem, viagens e tudo o mais que possa agregar valores e perpetuidade ao grupo.
             Não satisfeitos com o simples contato virtual, a turma partiu para um encontro anual, que caminha para sua quarta edição. As duas primeiras ocorreram em Belo Horizonte e a última em Governador Valadares, todas da melhor qualidade. São dois dias de festa, com direito a comes e bebes, camiseta, muita alegria e nenhuma influência política.
            Pode até parecer uma coisa singela, nada mais do que uma confraternização entre amigos que se conhecem de velhos tempos. Mas não deve ser assim encarada. Pensado bem, é o reencontro de personagens que, após longa ausência, voltam às origens, numa rara oportunidade de mostrar as transformações por que passaram e as conquistas colecionadas em outras plagas. Em contrapartida, a eles é dada a chance de refletir sobre o quanto foram importantes os exemplos e os primeiros ensinamentos recebidos de seus pais, mestres, familiares e amigos, que os ajudaram a vencer os desafios com os quais se defrontaram em terras distantes.
            A celebração de 2018 valeu todos os esforços no sentido de torna-la realidade. Foi tão bem aceita, alegre e empolgante, que os organizadores decidiram não mexer naquilo que deu certo. Também a reunião deste ano ocorrerá nesta cidade, nos próximos dias 20 e 21, incluindo um jantar e um almoço festivos, nos mesmos moldes e locais do ano passado.
Ao que tudo indica, Valadares caminha para se tornar o palco oficial desse emblemático encontro, o que, aliás, seria justo e coerente. Afinal, a localidade oferece aos participantes, sobretudo os muitos que vêm de fora, a rara oportunidade de reencontrar parentes e velhos amigos, além de visitar locais e rever cenários que permanecem vivos em suas lembranças. Ademais, é o lugar em que funciona o tradicional Colégio Ibituruna, onde todos iniciaram a jornada cultural que os levou ao sucesso, e em torno do qual robustece a união de um grupo que não se cansa de curtir a saudade dos tempos estudantis.
           

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

GETÚLIO, O GRANDE


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce - 29.08.2019

            Como se não lhes bastasse provocar sobressaltos e intranquilidade em suas inúmeras vítimas, os problemas político-administrativos, agravados pela corrupção, pela retração industrial, pelo desemprego e por outras mazelas sociais, sempre contribuem para monopolizar as atenções populares.
            Talvez isso explique – embora não justifique – o esquecimento ou o melancólico decurso de algumas datas nacionais de histórica relevância, que acabam passando em branco.
            Nada a ver com o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, com o Dia Nacional de Combate ao Fumo, ou com o Dia de Santa Joana Maria da Cruz, aos quais o 29 de agosto é reservado. Em alguns locais, com maior ou menor intensidade, eles devem estar sendo celebrados.
           Mas há descasos inadmissíveis, como o acontecido no último dia 24, em vários pontos do país, quando transcorreu o 65º aniversário da morte do ex-presidente Getúlio Vargas.
            Grande personagem de uma época da qual ainda restam muitas testemunhas, Vargas é apontado como o mais importante chefe político brasileiro do último século.
            Gaúcho de São Borja-RS, presidiu o Brasil por duas ocasiões. A primeira de 1930 a 1945, conhecida como Era Vargas. Um marco na história brasileira, quando inúmeras alterações socioeconômicas aconteceram no país. A segunda de 1951 a 1954, eleito por voto direto.
            Entre outras grandes iniciativas, criou a Justiça do Trabalho, instituiu o salário mínimo e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Direitos trabalhistas, como carteira profissional, semana de trabalho de 48 horas e férias remuneradas, também são frutos de seu governo.
            Mesmo quando ditador foi um presidente que se destacou por importantes realizações como a criação da Cia. Siderúrgica Nacional, da Cia. Vale do Rio Doce e da Hidrelétrica Vale do São Francisco. Em 1953 criou a Petrobrás, resultado da campanha popular que começou em 1946, com o histórico slogan "O petróleo é nosso".
Assim como todo grande líder, tinha características próprias: foi o precursor do marketing pessoal em ampla escala, direitista convicto e populista ao extremo. Pelos admiradores era conhecido como “pai dos pobres”, por haver, em sua primeira passagem pelo poder, praticado uma abrangente política de direitos sociais e trabalhistas, atendendo a antigas reivindicações populares. Essas realizações foram amplamente divulgadas por um aparato publicitário que provocou verdadeiro "culto à personalidade" do então ditador.
No segundo mandato, iniciado em 1950, Getúlio manteve uma política nacionalista. Mas seu governo foi minado por várias crises.
Em 1954 a atmosfera política no Brasil tornou-se tensa e conturbada. Os últimos dias de governo foram marcados por forte pressão política feita pela imprensa e pelos militares. O povo estava insatisfeito com a situação econômica do país. Exigia-se a renúncia do presidente.
Vargas optou por ele próprio decidir seu destino. Cometeu suicídio no dia 24 de agosto de 1954, com um tiro no coração, em seu quarto, no Palácio do Catete, Rio de Janeiro, então capital federal.
Na carta-testamento que foi encontrada ao lado de seu corpo, escrita de próprio punho, Getúlio deixou um recado à nação: “Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente, dou o primeiro passo no caminho da eternidade, e saio da vida para entrar na história”. 
Getúlio levou consigo as qualidades de um grande estadista, ao qual o Brasil deve permanente e ampla reverência. Qualquer esquecimento será sempre imperdoável.

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

PALADINOS DO DIREITO


Por Etelmar Loureiro

- Diário do Rio Doce – 15.08.2019

                Coincidindo com o Dia dos Pais, transcorreu no último domingo uma das ocasiões em que o Direito é festejado no Brasil.
           A primeira é em 19 de maio, dia de Santo Ivo, patrono dos advogados. A outra é 11 de agosto, o Dia do Advogado, pois nessa data, em 1827, foram criados os dois primeiros cursos de Direito no país, um em São Paulo, outro em Olinda/Pernambuco.
           O marco é fixo, mas as celebrações se estendem por todo o oitavo mês do ano, em períodos alternados, segundo a conveniência dos promotores.
          Advogados existem aos montões, e se multiplicam com impressionante velocidade, na medida em que estão entre os especialistas mais requisitados.
              Segundo dados bem atualizados, há no Brasil mais de 1.400 escolas de Direito, enquanto no restante do mundo essa quantidade não chega a 1.200. O número de advogados brasileiros também é surpreendente; ultrapassa a casa de 1 milhão e 100 mil profissionais, o que corresponde a quase 18 Mineirões lotados. Se mantido o compasso de crescimento dos últimos anos, a previsão é de que, em pouco mais de 10 anos, esse contingente se eleve para incríveis 2 milhões. Os inscritos na 43ª Subseção da OAB são em torno de 3.000, número bem significativo para uma cidade como Governador Valadares, onde funcionam quatro cursos de Direito.
            De modo geral, competentes, dedicados e zelosos em seu trabalho, os advogados surgem como paladinos do direito e da verdade, nos conflitos de interesse.  Como bem realçou o jurista Ruy Barbosa, “o advogado pouco vale nos tempos calmos; o seu grande papel é quando precisa arrostar o poder dos déspotas, apresentando perante os tribunais o caráter supremo dos povos livres”. É como se destacam entre os grupos mais aclamados e benquistos da sociedade.
           Nem por isso são poupados das histórias, brincadeiras, gozações e piadas que servem para testar a esportividade e o humor dos profissionais liberais.
Algumas bem interessantes, a ponto de demonstrar o quanto são importantes o talento, a habilidade e a astúcia dos personagens envolvidos.
            Uma dessas, talvez desconhecida por muitos, mas premiada no Criminal Lawyers Award Contest, fala de um advogado de Charlotte-NC. Ele comprou uma caixa de charutos tão raros e caros que os colocou no seguro contra fogo.
Um mês depois, tendo fumado todos eles, e ainda sem quitar o seguro, o advogado registrou um sinistro contra a seguradora. Nesse ato, alegou que os charutos haviam sido perdidos em uma série de pequenos incêndios.
A seguradora recusou-se a pagar, citando o motivo óbvio: o segurado havia consumido seus charutos da maneira usual.
O advogado processou a companhia..., e ganhou!
Ao proferir a sentença, o juiz concordou com a seguradora em que a ação era frívola. Apesar disso, o magistrado alegou que o advogado "tinha posse de uma apólice da companhia, na qual ela garantia que os charutos eram seguráveis e, também, que eles estavam segurados contra fogo, sem definir o que seria fogo aceitável ou inaceitável" e que, portanto, ela estava obrigada a pagar o seguro.
Em vez de entrar no longo e custoso processo de apelação, a companhia aceitou a sentença e pagou US$ 15.000,00 ao advogado, pela perda de seus charutos raros nos “incêndios”. Depois que o advogado embolsou o cheque, a seguradora o denunciou, e fez com que ele fosse preso, por 24 incêndios criminosos!
Com base no registro de sinistro de sua autoria e no seu próprio testemunho, válidos para o processo anterior, o advogado foi condenado por incendiar intencionalmente a propriedade segurada. Acabou sentenciado a 24 meses de prisão, além de pagar multa de US$ 24.000,00.
Moral da história: cuidado com o que você faz!  A outra parte também pode ter um advogado; melhor e mais esperto!