domingo, 1 de maio de 2016

REJEITOS DO PODER

            A lama que se espalhou por toda a extensão do Rio Doce não é fruto do acaso, nem surgiu de um momento para outro. Ela se formou ao longo de anos, lenta e gradualmente. Tudo sob o olhar complacente de autoridades, empresários e membros de uma comunidade, que, seduzidos pelos resultados econômicos e financeiros das atividades que lhe deram causa, não atentaram para o risco a que estavam expostos.
            O que já é considerado o maior desastre mundial do gênero teve origem no em Mariana (MG), onde aconteceu o rompimento de uma barragem de rejeitos da mineradora Samarco. As calamitosas consequências, que até hoje se ampliam, incluem a morte de 19 pessoas e incalculáveis danos ambientais.
            Na definição técnica, os rejeitos são substâncias impuras ou defeituosas, resultantes do processo de beneficiamento do minério. Para que não prejudiquem a natureza, devem ser guardados em reservatórios apropriados e seguros, conhecidos como barragens de rejeitos.
            Em outras palavras, é o imprestável, o lixo da atividade mineradora, amontoado num dique que a qualquer momento pode não mais aguentar tanta imundice. Quando isso ocorre, a barragem se rompe e a tragédia é inevitável.
            Pensando bem, não só a mineração produz rejeitos. Na vida pública eles aparecem em larga escala, pouco importando a capacidade de suporte dos depósitos que os recebem. Isso é comum em todo o mundo, mas, no Brasil dos últimos 13 anos, a realidade tem sido cruel e insofismável. Parece que o país se transformou numa imensa barragem de rejeitos, utilizada por políticos, governantes, outros agentes públicos, empresários, lobistas e “amigos do rei”, para despejo de suas atitudes desonestas.
            Nesse ambiente repugnante, onde impera a corrupção, o brasileiro se sente ultrajado. Não mais aguenta conviver com tantas maracutaias, mentiras, hipocrisias, explicações medíocres, negativas descabidas, zombarias e muitas outras sem-vergonhices praticadas por bandidos de colarinho branco.
            Ninguém melhor do que o renomado conferencista Luiz Inácio Lula da Silva, de “notável saber” e comedida verborragia, para qualificar os responsáveis pela caótica “calmaria” em que se encontra o país. Num papo de alto nível com a presidente Dilma, irreverentemente grampeado, ele avaliou que "Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, nós temos um Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, um parlamento totalmente acovardado”. E, talvez querendo amenizar, arrematou dizendo que “Nós temos um presidente da Câmara filho da ****, um presidente do Senado filho da ****, não sei quantos parlamentares ameaçados, e fica todo mundo no compasso de que vai acontecer um milagre e que vai todo mundo se salvar”. Teve o altruísmo de poupar a chefe do Governo, certamente porque conversava com a própria.
            Os sinais de sobrecarga há muito se faziam sentir. Mas os escândalos revelados pela Operação Lava Jato foram a gota d’água que fez desmoronar a barragem de rejeitos do poder.
            E um mar de lama tomou conta da nação, hoje mergulhada em inflação galopante, juros altos, instabilidade cambial, recessão econômica, desemprego e outros flagelos.
            Diante de um Governo devastado pelo descrédito, o povo clama por troca de comando. Ideal, mesmo, seria que houvesse uma “limpa geral”, e o nosso mundo político recomeçasse no Éden (não confundir com Enem).      

Os otimistas sabem que a possibilidade de revitalizar o Rio Doce é remota, mas factível. Quanto à recuperação do Brasil, do jeito que as coisas andam, até Deus duvida. Com razão!

- Revista "Mais Mais PERFIL" de abril/2016
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