segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

O Rio Doce

Por Vinícius Bertoletti

 
         Quando eu era garoto pequeno, lá em Barbacena, à noite minha avó contava histórias para a gente e, quase sempre, terminava assim:
−Então, o rei deu uma festa enorme, com muitos bailes, doces e bebidas. Eu fui convidada e me diverti muito. Dancei, comi e bebi até me fartar e, quando a festa acabou, eu voltei para casa, trazendo doces na garrafa e vinho na peneira.
Invariavelmente, um dos netos perguntava (nós éramos crianças muito inocentes, não como as de hoje que sabem até brincar no computador):
− Vó, onde estão os doces?
A velha ria e dizia:
− Ah, meu neto! Os doces acabaram; quando eu estava passando na ponte, tropecei e eles caíram no rio. É por isso que agora ele se chama Rio Doce.
Nós ficávamos tristes com essa informação, tantas vezes repetida, e com uma vontade enorme de beber a água desse rio, que devia ser uma delícia. Mas, para nossa alegria, ela informava:
− Porém, eu consegui salvar um doce para vocês.
E trazia um manjar, que encerrava o festival de histórias de forma deliciosa.
Hoje não foram doces que caíram no rio e sim resíduos de minério de ferro, o que tornou o Rio Doce o mais amargo do mundo, algo que nenhuma avó poderá salvar.
E, como ela sempre dizia:
− Pé de pinto, pé de pato,
Quem quiser que conte quatro.
Agora, eu digo:
− Pé de pato, pé de pinto,
Quem quiser que conte cinco.
Salvem o Brasil das mineradoras
De ferro, nióbio ou zinco…


Guarapari, 22/02/2016