domingo, 28 de junho de 2015

AJUSTAMENTO DE CONDUTA

            A corrupção brasileira alastrou-se, está em todo lugar. Nos três poderes, no esporte, nas religiões, em qualquer área há gente metendo a mão no dinheiro do povo.
            Historiadores “genéricos” não têm dúvida em afirmar que é mal congênito, causado por um vírus que chegou ao Brasil no descobrimento, a bordo da esquadra de Cabral.
            Especula-se que já então teria acontecido o primeiro caso de desvio de recursos, por parte da ONG “Parceiros do Tesouro”, encarregada de administrar o programa “Minha Tribo, Minha Vida”.
            Daí ao “mensalão” e ao “petrolão” foi só questão de tempo, mas sem perda de tempo.  Assim como a história, a roubalheira avançou célere e implacável.
             Chegou-se a ponto de ações preventivas e punitivas perderem eficácia. Descarados e confiantes na impunidade, os corruptos avançam, ferozes e impiedosos. Até o juiz Sérgio Moro tem tido dificuldades para detê-los.
           Um antigo brocardo ensina que “se não puder vencer o inimigo, junte-se a ele”. Por semelhança, faria sentido imaginar que “se não puder eliminar o mal, aproveite-se dele”.
           Não se trata de aliar-se aos corruptos, nem de receptar aquilo que eles costumam abocanhar.
           A ideia é estabelecer com os mesmos um “ajustamento de conduta” que facilite a apuração e minimize os efeitos de suas práticas delituosas.
            O primeiro passo seria a formação do Cadastro Geral de Corruptos (CGC) com foto, identidade, CPF, endereço e demais dados dos profissionais da área. Esse banco de dados possibilitaria a emissão de nota fiscal, recibo ou outro documento que, se necessário, comprovaria o ilícito. Teria fim essa história de roubar e depois negar.
           A um só tempo, criar-se-ia o Imposto Sobre Valores Desviados (ISVD), incidente sobre quaisquer quantias surrupiadas dos cofres públicos.
           Para efeito de tributação, os corruptos seriam classificados em micro, pequenos, médios e grandes, cada um com seu “limite operacional” e campo de atuação definido.
           Ninguém poderia agir em mais de uma “frente”. Se, por exemplo, roubasse na área da saúde, ficaria impedido de fazer o mesmo em outro setor.
           O percentual do imposto variaria de acordo com o valor do desfalque. Quanto maior o roubo, maior a alíquota.
           A cobrança alcançaria indistintamente corruptos ativos e passivos, nas mesmas bases.
           Como toda obrigação gera direitos, os corruptos passariam a ter, entre outros, os benefícios do Fundo de Incentivo à Corrupção (FIC) e do Programa de Amparo à Corrupção (PAC). O primeiro destinado à capacitação da “classe”; o outro encarregado de dar assistência ao contraventor e à sua família, nos casos de demissão, aposentadoria, invalidez, prisão ou morte, com preferência para os dois últimos.
            O governo federal acaba de anunciar o segundo Programa de Investimentos em Logística (PIL), que envolverá recursos de quase R$ 200 bilhões, a serem aplicados em aeroportos, rodovias, ferrovias e portos. É mais uma grana preta a aguçar a volúpia de lobistas, palestrantes, empreiteiros, entes governamentais e outros que sempre encontram um jeito de levar vantagens ilegítimas.
              Impõe-se, pois, encontrar, com urgência, um meio, mesmo bizarro, de regular o processo corruptivo, na tentativa de salvar pelo menos parte do que a bandidagem insiste em afanar. Melhor pouco do que nada.

           A taxação dos valores roubados é alternativa sujeita a análise e aperfeiçoamento.  Em tão curto espaço, seria impossível concebê-la perfeita.  Tem tudo pra dar certo, desde que o lançamento do tributo não fique a cargo do contribuinte que se quer alcançar. Aí seria bicorrupção!

- Diário do Rio Doce (16.06.2015)

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