quinta-feira, 25 de abril de 2013

NO REINO DA TRAIRAGEM


          Assim como as conquistas, as descobertas, as invenções e outros grandes marcos, as traições ocupam espaço nobre na biografia da humanidade.
          Estão presentes na boemia, na política, no futebol, na religião, no meio artístico, nas relações empresariais, no campo diplomático e onde mais haja gente, sobretudo na vida a dois.
          A antologia de traições é extensa, abrangendo casos curiosos e instigantes.
          O mais emblemático tem como protagonista Judas Iscariotes, o apóstolo mau-caráter que entregou Jesus Cristo, por míseras trinta moedas de prata. Tornou-se símbolo da canalhice.
          Outro clássico é a tragédia romana em que Brutus participou do assassinato de seu pai adotivo, o imperador Júlio César, incluindo-se entre os que o apunhalaram.
          No Brasil, embora acirradamente disputado pelos homens públicos, o “Troféu Traíra” está em poder de Joaquim Silvério dos Reis, desde quando ele dedurou a Inconfidência Mineira, fazendo com que Tiradentes se ferrasse.
 
          Fonte inesgotável de mexericos, as traições que mais provocam buchichos são as “puladas de cerca”, com destaque para as cometidas por gente famosa. Na categoria há muitos enredos e atores premiados.
 
          Os incendiários “affaires” de Cleópatra indicam uma prática anterior à Era Cristã. A rainha do Egito não era bela como foi revivida no cinema por Elizabeth Taylor, mas tinha o talento de Hilda Furacão.
 
          Mais recente, o triângulo amoroso formado pela princesa Diana, o príncipe Charles e a então amante dele, Camilla Parker, quase fez desmoronar o Reino Unido. A monarquia balançou.
 
          Não menos explosivas foram as incursões eróticas de John Kennedy e Bill Clinton, capazes de provocar inveja em Silvio Berlusconi. Tanto quanto elas, marcaram época as trapalhadas de alcova em que se meteram certos ex-presidentes de países sul-americanos, envolvidos com mulheres jornalistas, domésticas e róseas secretárias.
 
          Por abomináveis que sejam, as traições mexem com o emocional. Inspiram obras literárias, teatrais, cinematográficas, televisivas e musicais. O interesse por elas é diretamente proporcional à intensidade dos escândalos e ao prestígio dos envolvidos.
 
          Até recentemente, obedeciam a uma liturgia que impunha paciência, habilidade, persistência, bastante coragem e discrição. Por isso eram mais excitantes. Hoje já não têm tanto charme, nem despertam a adrenalina de outros tempos. A quebra de tabus sociais e a evolução dos meios de comunicação tornaram tudo mais fácil. Homens, mulheres, jovens e velhos, políticos, empresários, falsos religiosos, quase todos arriscam uma escapulida.  Basta um telefonema, um torpedo, um MSN cifrado e correr para o abraço. Lealdade deixou de ser obrigação, para transformar-se em opção dos poucos que se dispõem a defendê-la (bem lembrado!).     

           A modernidade descomplicou o processo, mas não saneou o Reino da Trairagem. Os desequilibrados e despreparados ainda agem aos montões, encenando recorrentes situações que seriam cômicas, não fossem trágicas.

          O exemplo poderia resumir-se na atitude do proprietário de circo que matou sua mulher e o gorila com o qual ela contracenava, suspeitando que tivessem um caso. Outro sintoma foi o barraco armado pela esposa que se sentiu traída, quando, ao desmontar o aspirador da casa, encontrou uma calcinha que não era dela.

          Mas a mediocridade vai longe. Em Vila Velha, Espírito Santo, um sexagenário casado há mais de trinta anos, pai de três filhas, excedeu na bizarrice: largou a família para juntar-se ao o genro, com quem mantinha tórrido romance, curtido em furtivas viagens e pescarias. Doido!

          Depois dessa, não há como discordar de Júlio César. Segundo o filósofo Plutarco, o imperador declarou que amava as traições, mas odiava os traidores. Sujeito sensato!
 
Texto publicado na revista
"Mais Mais PERFIL" de abril/2013

 

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