Entre
aplausos e apupos, está em vigor a intervenção federal no Rio de Janeiro.
A
implementação da medida tem sido alvo de diferentes julgamentos. Um dos mais polêmicos
insinua que ela teria sido a saída honrosa imaginada pelo governo, para
sepultar uma controversa reforma da Previdência que, já se sabia, não seria
aprovada pela Câmara. Outra visão é a de que, acalentando o sonho de fazer seu
sucessor, ou até mesmo de “suceder a si próprio”, Michel Temer teria desistido
da austera agenda reformista, com a qual se dizia comprometido, em favor de
ações mais populares, capazes de render votos a ele e ao seu partido. Nesse
particular, teria sido convencido de que uma iniciativa rotulada de combate à
criminalidade poderia surtir bom resultado.
Conjeturas
à parte, essa intervenção traz consequências que, se não invalidam a sua conveniência,
tornam, quando nada, discutível a sua oportunidade. A pior de todas é paralisar
o trâmite de mais de 1.100 propostas de emenda à Constituição, que se encontram
no Congresso Nacional.
Só no Senado, estão perto
de 550 PECs, algumas prontas para serem incluídas na ordem do dia, para votação
no Plenário. Entre essas, por irônica
coincidência, a que proíbe o contingenciamento de recursos destinados ao Fundo
de Segurança Pública, que já estava na pauta do último dia 20.
Nesse rol, também figuram
a proposição que atribui à União a responsabilidade pelo financiamento da
educação básica pública; a que cria a possibilidade de apresentação de
candidaturas a cargo eletivo sem a obrigatoriedade de filiação partidária — as
chamadas candidaturas avulsas ou independentes; a que proíbe a cobrança de
impostos sobre medicamentos de uso humano; e a que reduz o número de deputados
federais de 513 para 386, e de senadores, de três para dois por unidade da
federação, afora outras de grande importância.
Mais lamentável,
entretanto, é a solução de continuidade imposta à PEC que restringe o “foro
privilegiado”, instituto que atualmente favorece em torno de 55 mil autoridades
brasileiras. Em meio a elas, o presidente da República e seu vice,
governadores, ministros de estado e de tribunais superiores, senadores,
deputados federais e estaduais, prefeitos, juízes, membros do Ministério
público e mais “gente fina”. Com o trancamento imposto pela intervenção, resta
a esperança de que uma rápida decisão venha do Supremo Tribunal Federal, onde o
assunto é contemplado em processo que desde novembro está “sob vistas” do
ministro Dias Toffoli
Ainda que bem
intencionada, a intervenção na segurança pública do Rio implica efeitos
colaterais sugestivos de que a medida também leva em conta uma boa dose de interesses
políticos do governo e das forças dominantes.
Por outro lado, a
opinião pública, leiga no assunto, não está conseguindo entender a fixação de
prazo para combater um inimigo enraizado, astucioso, modernamente aparelhado,
que não tem o menor compromisso com o cronograma oficial. O próprio comandante
do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmou que o período de nove meses
“é insuficiente para que se possa atingir com profundidade as causas que
levaram a esse estado de coisas”. O mais provável é isso facilitar a vida do
adversário, que, conhecendo o tempo da ação militar, poderá programar férias,
fazer cursos de aperfeiçoamento, prestar serviços comunitários, simplesmente se
refugiar, ou agir em outras paróquias, até a data estabelecida para o “bye bye”
dos seus combatentes.
“Consummatum est”, resta
torcer pelo êxito da operação, e para que seus resultados sejam medidos pelos
avanços sociais alcançados, e não pela quantidade de cruzes erguidas ao longo da jornada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário