quinta-feira, 1 de março de 2018

INTERVENÇÃO POR TEMPO CERTO

Por Etelmar Loureiro

            Entre aplausos e apupos, está em vigor a intervenção federal no Rio de Janeiro.
            A implementação da medida tem sido alvo de diferentes julgamentos. Um dos mais polêmicos insinua que ela teria sido a saída honrosa imaginada pelo governo, para sepultar uma controversa reforma da Previdência que, já se sabia, não seria aprovada pela Câmara. Outra visão é a de que, acalentando o sonho de fazer seu sucessor, ou até mesmo de “suceder a si próprio”, Michel Temer teria desistido da austera agenda reformista, com a qual se dizia comprometido, em favor de ações mais populares, capazes de render votos a ele e ao seu partido. Nesse particular, teria sido convencido de que uma iniciativa rotulada de combate à criminalidade poderia surtir bom resultado.
            Conjeturas à parte, essa intervenção traz consequências que, se não invalidam a sua conveniência, tornam, quando nada, discutível a sua oportunidade. A pior de todas é paralisar o trâmite de mais de 1.100 propostas de emenda à Constituição, que se encontram no Congresso Nacional.
Só no Senado, estão perto de 550 PECs, algumas prontas para serem incluídas na ordem do dia, para votação no Plenário.  Entre essas, por irônica coincidência, a que proíbe o contingenciamento de recursos destinados ao Fundo de Segurança Pública, que já estava na pauta do último dia 20.
Nesse rol, também figuram a proposição que atribui à União a responsabilidade pelo financiamento da educação básica pública; a que cria a possibilidade de apresentação de candidaturas a cargo eletivo sem a obrigatoriedade de filiação partidária — as chamadas candidaturas avulsas ou independentes; a que proíbe a cobrança de impostos sobre medicamentos de uso humano; e a que reduz o número de deputados federais de 513 para 386, e de senadores, de três para dois por unidade da federação, afora outras de grande importância.
Mais lamentável, entretanto, é a solução de continuidade imposta à PEC que restringe o “foro privilegiado”, instituto que atualmente favorece em torno de 55 mil autoridades brasileiras. Em meio a elas, o presidente da República e seu vice, governadores, ministros de estado e de tribunais superiores, senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos, juízes, membros do Ministério público e mais “gente fina”. Com o trancamento imposto pela intervenção, resta a esperança de que uma rápida decisão venha do Supremo Tribunal Federal, onde o assunto é contemplado em processo que desde novembro está “sob vistas” do ministro Dias Toffoli
Ainda que bem intencionada, a intervenção na segurança pública do Rio implica efeitos colaterais sugestivos de que a medida também leva em conta uma boa dose de interesses políticos do governo e das forças dominantes.
Por outro lado, a opinião pública, leiga no assunto, não está conseguindo entender a fixação de prazo para combater um inimigo enraizado, astucioso, modernamente aparelhado, que não tem o menor compromisso com o cronograma oficial. O próprio comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmou que o período de nove meses “é insuficiente para que se possa atingir com profundidade as causas que levaram a esse estado de coisas”. O mais provável é isso facilitar a vida do adversário, que, conhecendo o tempo da ação militar, poderá programar férias, fazer cursos de aperfeiçoamento, prestar serviços comunitários, simplesmente se refugiar, ou agir em outras paróquias, até a data estabelecida para o “bye bye” dos seus combatentes.
“Consummatum est”, resta torcer pelo êxito da operação, e para que seus resultados sejam medidos pelos avanços sociais alcançados, e não pela quantidade de cruzes erguidas ao longo da jornada.

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